24 de julho de 2011

Os sinais da vocação não são necessariamente especiais (capítulo II)

Excertos do livro "Vocação Sacerdotal" do padre José Maria da Congregação do Verbo Divino. Escrito para meninos da idade de 12 anos.




"Com efeito. É muito comum a confusão que se faz entre a graça da vocação sacerdotal e os sinais que mostram haver vocação, confusão que acarreta não poucas vezes, infelizmente, a perda da vocação.

Era e é ainda mui frequente a convicção de que Deus tem de mostrar por sinais extraordinários a existência da vocação, por uma inclinação especial, por impulsos internos do Espírito Santo, por prazer em coisas santas, na liturgia, nas procissões, etc. Pensa-se que só tem vocação verdadeira o menino que gosta de brincar de padre, tem seu altarzinho, anda pelos cantos da casa rezando e meditando, gosta de ajudar na missa, etc.

Indício, digo, portanto, uma manifestação da alma infantil que merece ser observada e estudada para ver si atrás dele não haverá porventura sinais claros da vocação.

"Para que alguém possa ser admitido às ordens pelo bispo não se requer senão reta intenção e aquela aptidão da natureza e da graça que se prova pela integridade da vida e pela suficiência de conhecimentos, e que dá fundadas esperanças de poder (o candidato) desempenhar dignamente o munus sacerdotal e observar santamente as respectivas obrigações." (Papa São Pio X)


1º - Reta intenção:

Consiste no desejo de ser padre para glorificar a Deus e para fazer bem às almas. Naturalmente não se pode exigir essa mentalidade completamente desenvolvida numa criança de poucos anos.

Porém, pode e deve esperar, entretanto, que o candidato ao sacerdócio esteja isento de intenções humanas, naturais, interesseiras, temporais. Seria intenção humana aspirar ao sacerdócio só por causa das honras de que o padre se torna alvo, ou para um dia vir a ser Monsenhor (bispo), etc. Seria intenção natural querer ser padre para glorificar a família; é verdade o sacerdócio é grande distinção para a família da qual sai um padre; mas seria falso desejar ser padre só para honrar a própria família. Intenção interesseira ou material teria quem se enveredasse ao sacerdócio para enriquecer, levar vida folgada, comer bem, viver bem, dormir bem.

A escolha de qualquer vocação, mais ainda da vocação sacerdotal é tão importante que se deve fazer-se entre Deus e a alma exclusivamente. A alma, uma; Deus a outra parte interessada.

2º - Integridade de vida:

O padre, conforme os desejos do Sagrado Coração de Jesus, deve ser um anjo em forma humana, deve viver diante de seus paroquianos uma vida santa.

Lembro-me ainda do meu tempo de criança. Nosso vigário era um padre exemplar. E foi o exemplo de sua vida que fez nascer em mim o desejo do sacerdócio. O cérebro infantil também sabe pensar. Pensa de seu modo, mas pensa. Para minha inteligência pequenina o padre vigário era um ente do céu, um ser que não faz pecado. E então eu senti um grande desejo de ser assim como ele.

O menino que quer ser padre tem de mostrar desde pequeno essa inclinação para coisas santas. A integridade de vida consiste:

- na inclinação à piedade: não precisa ser uma piedade exagerada. Basta, e até é melhor, que seja sólida. Creio que a norma mais segura é a piedade que o menino aprendeu no colo da mãe.
- no amor à pureza de coração. O padre tem que viver em pureza perfeita, porque está ligado a isso por uma promessa solene chamada voto de castidade.
Pelo voto de castidade ele promete a Deus nunca cometer um pecado contra o sexto mandamento. 
Para ser capaz de fazer e cumprir tal promessa é necessário conservar limpo o coração desde pequeno.
Um rapazinho puro dá esperança de ter vocação e de ficar firme.
Um menino que anda em más companhias na rua, que aprende toda sorte de coisas imorais, que se entrega a pecados feios, que chega até a ensinar outros a pecar, se tal menino alimentou algum dia o desejo do sacerdócio é melhor largar. Não será feliz como padre. Exporá a própria alma à perdição eterna, levará, talvez, outras almas à desgraça.
- respeito, obediência aos pais e superiores. O padre está colocado sob as ordens dos seus superiores, inclusive ao Santo Papa. A obediência não se aprende adulto, isso de ser aprendido em pequeno.
- caráter maleável e caridoso. Meninos que são egoístas, que não gostam do convívio com os colegas que vivem ensimesmados, alheios aos outros, indiferentes, não são bons elementos para o seminário.

3º - Suficiência de talento:

O estudo no seminário é um tanto pesado, daí a necessidade de algum talento para dar contas deles. Para os que tem muita dificuldade em estudar, não poderá ter este sinal decisivo da vocação: deve largar e procurar outra carreira.

4º - Saúde:

A vida do sacerdote impõe muitos incômodos e sacrifícios e exige um corpo resistente e bem desenvolvido. Um organismo habitualmente enfermo não dá tal garantia. Um menino que quase sempre está adoentado aconselho que largue esta ideia e procure outra carreira."



23 de julho de 2011

Santa Brígida, rogai por nós!

Salve Maria!
Hoje, dia 23/07, é dia de Santa Brígida; a ela minha homenagem.



Desde criança Brígida tinha visões. Uma vez viu a Virgen Maria colocar em sua cabeça uma coroa. Em outra ocasião, viu diante dela Jesus Cristo torturado e morto na cruz. Esses dois temas, a profunda devoção a Maria e as meditações sobre o sofrimento de Cristo marcariam toda a vida de Santa Brígida.

Brígida ficou orfã de mãe quando tinha cerca de 10 anos de idade. Seu pai, se considerando incapaz de prover educação compatível com a de uma menina de sua condição social, a enviou para a casa da cunhada Catarina Bengtsdotter, em Aspanäs, próxima ao lago Sommen, em Östergötland.

Alguns anos mais tarde, quando Brígida tinha por volta de 13 anos, foi dada em matrimônio contra sua vontade a Ulf Gudmarsson. Foi mãe de oito crianças, entre elas Santa Catalina de Vadstena.

A devoção de Brígida também influenciou seu marido. Entre outras viagens, o casal realizou peregrinações a Nídaros (atual Trondheim) e a Santiago de Compostela. Esta última seu pai já a tinha igualmente realizado. A caminho da Espanha, na cidade francesa de Arras, Ulf adoeceu. De volta a Suécia, Brígida e o marido se estabeleceram junto ao convento de Alvastra, onde Ulf faleceu em 1344, aproximadamente.

Após a morte de Ulf, Brígida repartiu seus bens entre os herdeiros e os pobres, passando a viver de maneira simples nas imediações do convento de Alvastra. Nessa época, suas visões se tornaram mais numerosas, formando a maior parte das aparições que Brígida vivenciou até sua partida para Roma. 

Brígida viajou a Roma no ano de 1349 com o propósito de tomar parte na celebração do jubileu de 1350, e para obter permissão do papa para fundar uma nova ordem religiosa. Entretanto, na ocasião o papa residia em Avignon e, além disso, a Igreja havia proibido o estabelecimento de mais ordens. A ausência do papa desanimou Brígida, que havia tido uma visão na qual encontraria o papa e o Imperador quando chegasse a Roma.

Em Roma, residiu primeiramente ao redor da basílica de São Lorenço. Foi testemunha do decaimento espiritual da cidade após a partida do papa. Durante sua estadia na cidade, escreveu cartas ao papa, onde lhe suplicava que regressasse a Roma, e se dedicou a visitar as igrejas que continham tumbas de santos. Nas igrejas de São Lourenço de Panisperna, na colina de Viminale, pediu aos transeuntes esmolas para os necessitados. Também aproveitou para viajar em peregrinação ao santuários de Assis, à Nápoles e ao sul da Itália.

Em 1368, o papa Urbano V regressou a Roma e, em 21 de outubro recebeu o Imperador Carlos IV. Então, Brígida pôde entregar as regras de sua ordem ao papa, que se encarregaria de examiná-las. As regras foram aceitas com várias revisões e grandes mudanças com as quais Brígida provavelmente não concordava. Além disso, o papa tomou a decisão de deixar novamente a Itália por motivos de segurança, situação com a qual Brígida também não estava de acordo. Ela profetizou que o papa receberia um forte golpe de deus e, após dois meses do regresso a Avignon, Urbano faleceu.

Em 1371, quando tinha aproximadamente 68 anos, Brígida realizou uma viagem à Terra Santa, com um itinerário que passaria por Nápoles e Chipre. Em Nápoles, faleceu seu filho Carlos Ulvsson, o que lhe acarretou grandes preocupações. Brígida teve, então, outra aparição, que lhe garantiram o perdão divino a seu filho e agradeceram às orações e lágrimas de sua mãe. Quando voltou à Roma, no verão de 1373, uma enfermidade à debilitou, e Brígida faleceu no que é hoje a praça Farnese. De acordo com sua própria vontade, seus restos mortais foram transladados para a Suécia, especificamente para o convento de Vadstena, após haverem sido enterrados na igreja romana de São Lourenço em Panisperna. 

Em 1377, por ordem do bispo Alfonso Pecha de Vadaterra, amigo e confessor de Brígida, foi à luz a primeira edição de suas Aparições celestiais. Em 1378, foi ao fim outra aprovação sobre as regras da ordem religiosa de Brígida, e em 1384 se consagrou o convento de Vadstena.

O processo de canonização de Brígida começou em 1377 e terminou em 1391. Em 1999, santa Brígida foi elevada, junto com santa Catalina de Siena e santa Teresa Benedita da Cruz, à copatrona da Europa.

A ordem de Santa Brígida perdura até nossos dias, sob o nome de Ordem do Santo Salvador (Ordo Sancti Salvatoris), chamada comumente de Ordem Brigidina. Os restos de santa Brígida se encontram no convento de Vadstena. O edifício onde a santa vivou em Roma, a Casa de Santa Brigida, contem um templo, um convento, e um albergue.


20 de julho de 2011

Chover debaixo pra cima!


Salve Maria!

Quando leigo quer tomar o lugar que não lhe compete dá nisto: Chove debaixo pra cima!

Não adianta! A teimosia, a soberba, o descaso e a mania de servir a Lúcifer, querendo se igualar a Deus é algo realmente nojento! Interessante que quanto mais velho (a) a banana, mas difícil de desentortá-la!

E aí, em contra partida vemos o clero que deveria nos ensinar o CORRETO, baixando a cabeça pra "fiel" fazer o que bem entender: reflexão sobre o Evangelho (NINGUÉM MERECE!), dessacralizar o Templo de Deus, inflar de vaidade com suas "inspirações divinas", fazer da Igreja um "barzinho" de quermesse... Vejamos a foto e o link indicado. 

Quando o macaco pula em galho errado dá nisto!





Cliquem no link que segue e vejam a reportagem:



19 de julho de 2011

Como cansa!

Salve Maria!

Como cansa meu Deus, os meus pecados!
Como cansa as minhas limitações!
Como cansa e me aborrece quando faço justamente o que sei estar errado!

Como cansa os pecados alheios!
Como fico aborrecida por ter que vê-los e algumas vezes até consenti-los por falta de forças, de ânimo em exortá-los à virtude e abandono do pecado!

Como ando cansada com esta humanidade toda! Cansada dos que sabem tudo; cansada dos que "acham" que sabem muito; cansada dos que não sabem nada; cansada daqueles que desejam não saber nada... Que chato tudo isto!

Nossa! Perdi total a paciência com minha impaciência; perdi total a paciência com a paciência dos outros!

Não agüento mais aqueles que "sentem dentro do coração" aquilo que Deus quer... Quanta prepotência! Cospem na tradição e ainda tem a pachorra de se acharem "cheios" do Espírito Santo! Que asco eu tenho por estes!

Daqueles que fazem da Igreja um local de encontro dos "reacionários" também eu tenho desprezo, aliás, eu tenho nojo!

Dos tradicionais,  exemplo:EU (!), que não conseguem mudar uma vírgula rumo à verdadeira conversão, transformando palavras em ações... Nossa, destes eu queria distância, mas como fugir de mim mesma?

Enfim, agarro-me a minha Mãe, minha Senhora... Estrela da manhã, Aurora que rompe a escuridão das trevas do pecado; Luz de Cristo a guiar seus filhos!

Ó Maria sem pecado concebida, rogai por nós que recorremos a Vós!

Também clamo pelo Reinado de Cristo, que Deus permita que eu encontre o seu Reino e sua Justiça! Porque nós somos cansativos demaiiiiiiiiiiiis!


Sacratíssimo Coração de Jesus, venha a nós o Vosso Reino!

Vem Senhor Jesus, vem em socorro da Sua Pequena e ainda fiel Igreja!


16 de julho de 2011

Revista Co-Redentora



O ensinamento político de São Pio X

por Jean Ortoli

Papa São Pio X

 INTRODUÇÃO
Creio que não é necessário apresentar São Pio X ao leitor da revista Le Sel de la Terre, mas gostaria de chamar a atenção para um aspecto importante da vida de José Melchior Sarto: seu nascimento, em 2 de junho de 1835, em Riese, vilarejo de Veneza, numa modesta família de agricultores. Filho da terra e marcado por ela, ele deve a suas origens camponesas o excepcional senso de realidade e a tenacidade a toda a prova que foram, ao longo de seu pontificado (1903-1914), o traço dominante de seu ensinamento e de sua atividade política.
Voltaremos a isso numa breve conclusão.
Este artigo é parte de uma tese de doutorado feita em 1971 de História do Direito e das Instituiçõesseção de nossas faculdades cujo programa reserva um lugar para a Igreja Católica entre as instituições francesas desde a Gália romana até os tempos modernos; lugar justificado pelos conselhos dados pela Igreja, bem enraizados na sociedade civil desde suas origens, e pelos papéis que ela desempenhou ao longo de sua história.
Sociedade de dimensões temporais, certamente, que ocupa um lugar evidente no ranque das instituições na sociedade dos homens, a Igreja também é, e acima de tudo, ao menos para seus fiéis, uma sociedade espiritual cuja finalidade suprema – a salvação eterna – se impõe a todos, membros da hierarquia e simples fiéis, mesmo que contrarie ou desafie os objetivos e interesses temporais: o pontificado de Pio X, rico de acontecimentos às vezes dolorosos, especialmente na França e Portugal, é uma perfeita ilustração disso.
Levando em conta essa dupla “dimensão” da Igreja, o objetivo de nossa tese consistia em fazer aparecer, através das atividades do pontificado de Pio X, os laços fortes e constantes que uniram as duas ordens, espiritual e temporal, ficando a segunda, em todos os casos, submissa à primeira. Creio que o leitor desta revista já está convencido disto, mas restava demonstrá-lo, apoiado em citações e exemplos, a um júri da Faculdade pública. Em outras palavras: como a Igreja absolutamente não é uma sociedade como as outras, era preciso pôr em evidência a “lógica eclesiástica” em que se enquadra a política do pontificado de Pio X. Por exemplo, como e por que consideráveis interesses materiais – os bens da Igreja na França – foram sacrificados no altar da República para salvaguardar o essencial: a liberdade da Igreja da França, necessária ao exercício de sua missão divina.
As pesquisas sobre o pontificado de Pio X conduziram o autor a analisar o conjunto dos atos oficiais da época (1903-1914) de maneira sistemática.[1] Tratando-se da sociedade civil, é importante distinguir os dois campos de atividade pontifical que aparecem de antemão:
– o governo propriamente dito: a política interna própria da Igreja (na França, o caso do Sillon, por exemplo); a política externa, sobretudo em relação aos Estados (o caso da separação, por exemplo);
– o ensinamento, de importância capital, pois é a doutrina da Igreja, recordada de maneira precisa pelos sucessivos Papas que a têm por guia em suas atividades internas e externas e que a explicitam segundo as necessidades do momento.
Neste ensinamento, a filosofia política desempenha um papel essencial. Louis Jugnet nos lembra que “toda doutrina política, tenha-se consciência disso ou não, supõe uma filosofia […]. Só se analisa verdadeiramente bem uma doutrina política quando se conhecem suas raízes filosóficas, explícitas ou não”.[2]
Ora, o estudo dos textos oficiais de Pio X revela um verdadeiro corpus de doutrina e de filosofia política, um conjunto de dimensão insuspeitada – pelo menos para o autor dessa tese… – e de rigor impressionante. Propomos aqui resgatar seus traços essenciais, divididos em duas partes:
1 – os fundamentos e as características gerais do ensinamento político de Pio X;
2 – a doutrina política decorrente.

I. FUNDAMENTOS E CARACTERÍSTICAS GERAIS DO ENSINAMENTO POLÍTICO DE PIO X

O ensinamento de um Papa, sem dúvida, não é conferido por acaso: o contexto religioso, político e social do momento o exigem na maioria das vezes. Ameaças e diversas derivas estiveram na origem dessas admoestações, em teologia e espiritualidade certamente, mas também na doutrina política quando o estado da sociedade civil necessitava.
Sob o pontificado de Pio X, a ameaça mais grave tinha nome: o liberalismo político que afetava a sociedade civil em seus fundamentos e em seu funcionamento, além de contagiar a sociedade religiosa sob a expressão do que chamamos modernismo.
Pio X enfrentou esta ameaça determinando uma rigorosa ordem de batalha e reafirmando firmemente os princípios.
Eis aqui as etapas principais, apresentadas em sua sucessão lógica.
Evocação do objetivo primordial, a salvação eterna, finalidade suprema a ser alcançada por todos os fiéis.
A Igreja existe para ajudar os fiéis nesta via. Para a doutrina católica, na verdade, só seriam possíveis verdadeiras concepções do homem levando-se em conta o fim último, pois Deus é o início e o fim de todas as coisas, incluindo a sociedade civil: convém, diz Pio X, “que o reino de Deus se estabeleça sobre a terra para a salvação eterna dos homens”.[3]
Portanto, desde aqui na terraOmnia instaurare in Christo – Restaurar tudo em Cristo – é o verdadeiro Leitmotiv do ensinamento de Pio X e a chave indispensável para bem compreender as atividades de seu pontificado.[4]
Esses valores sobrenaturais lembrados várias vezes por Pio X são de fato indispensáveis à boa ordem natural. Leiamos o Padre Luc J. Lefèvre a esse respeito:
Pio X dá prioridade ao critério sobrenatural. Ele julga e exige que nós julguemos todas as coisas segundo as luzes da fé. Não seria suficiente evocar os princípios? Não, porque os princípios são dados para abrir caminhos e levar à ação. Pio X exige a aplicação exata, até rigorosa, dos princípios.[5]
     Como atingir o objetivo?
Pio X nos dá o método: recorrer à razão – a filosofia – e à fé – a teologia –, que em nada se opõem. Pio X precisa: “Entre razão e fé não pode haver desacordo real”,[6] pois razão e fé são “duas filhas do mesmo Pai”.[7]
• Com a filosofia e a razão, que ela utiliza, é possível aceder à verdade ensinada pela Igreja com a condição de que a filosofia tradicional, que percebe o real, ocupe seu devido lugar: precaução indispensável, pois, escreve Pio X, “é inevitável que um falso princípio em filosofia corrompa todo o restante”.[8]
• Quanto à teologia, “tem por base a Revelação divina: ela fortalece na fé os que já têm a felicidade de levar o nome de cristão”.[9]
Na hierarquia das ciências, incluída a filosofia, a teologia deve ocupar, conseqüentemente, o primeiro lugar: “Em meio a esta grande abundância de ciências tão diversas que se oferecem ao espírito ávido de verdade, é de direito que a teologia tenha o primeiro lugar.”[10]
• Entre todos os métodos de teologia e de filosofia, deve-se dar prioridade ao da escolástica, sobretudo ao de Santo Tomás de Aquino: “Quando prescrevemos a filosofia escolástica, o que entendemos por isso – e este esclarecimento é capital – é a filosofia que nos legou o Doutor Angélico”,[11] filosofia em que aparecem claramente “os fundamentos sobre os quais toda a ciência das coisas naturais e divinas se encontra estabelecida”.[12]
Pio X condena então todo progresso da ciência filosófica e da teologia? Claro que não, desde que não se confundam os princípios tradicionais, que devem ser respeitados, com os métodos que podem beneficiar-se de verdadeiros progressos.[13] 
A teologia e a “sã filosofia” vão assim permitir a refutação dos erros doutrinais: neste caso, os erros do liberalismo e dos sistemas dele originados.
As refutações
A rejeição do liberalismo
Já condenado por Pio IX no famoso Syllabus, o liberalismo alastrava-se mais do que nunca, especialmente na tentativa de sua conciliação com a doutrina católica que foi o modernismo. Pio X deplora o gravíssimo dano causado aos indivíduos que, levados pelas opiniões do liberalismo moderno [...], bebem em seguida [...] o veneno mortal de certas idéias que jamais poderão ser aceitas pela Igreja.[14]
Estas palavras iriam atravessar os séculos…
Mas de onde vem esta ideologia liberal? Pio X situa suas raízes históricas na Reforma e na Revolução: a Reforma, que preparou “as rebeliões e a apostasia dos tempos modernos”,[15] seguida, dois séculos depois, pelas “doutrinas dos pretensos filósofos do século XVIII, doutrinas da Revolução e do Liberalismo tantas vezes condenadas”.[16]
Quanto às raízes filosóficas, Pio X as denuncia particularmente na encíclica Pascendi e no Motu proprio de 1910:[17] trata-se do idealismo, ou subjetivismo, e do individualismo decorrente: esse “vago e mentiroso idealismo em que a razão individual é soberana…”[18]
Refutação dos sistemas derivados do liberalismo
Pio X refuta em seguida, com toda a lógica, todos os “produtos derivados” do liberalismo, todos ligados entre si como num grande conjunto de sistemas ideológicos que apresentamos aqui sucintamente:
O racionalismo: Pio X conclama a “combater virilmente esse flagelo da razão e da fé que se espalha por todas as partes [...]. É o neo-racionalismo, cuja perniciosa influência deve ser afastada a qualquer preço”[19], até por certos católicos que fazem força para conciliar racionalismo e religião. “Inchados como pavões pelo espírito de vaidade, esforçam-se erroneamente por estabelecer a fé sobre a única base da razão natural.”[20]
O naturalismo: Nega-se, na verdade [escreve Pio X] que exista algo acima da natureza: a existência de um Deus criador de tudo e cuja Providência reja o universo.[21]
Entre outras conseqüências, os partidários dessa teoria colocam unicamente na natureza toda a excelência da virtude, sem preocupar-se em recorrer à fé e à graça divina. Segue-se que os atos que têm por princípio somente a honestidade natural não passam de aparências de virtude: não são nem duráveis em si nem suficientes para alcançar a salvação.[22] 
O romantismo, incluindo o sentimentalismo religioso. Citando a Bíblia, o Papa escreve que a Igreja sabe “quanto os sentimentos e os pensamentos humanos são inclinados ao mal”[23] (Gên, VIII, 21). O Papa adverte várias vezes os “sillonistas”[24] contra a “exaltação de seus sentimentos, a cega bondade de seus corações e seu misticismo filosófico mesclado de certo iluminismo”.[25] Essas tendências não ficam sem conseqüências no funcionamento da sociedade civil, especialmente no que se chamava “questão social”.
O agnosticismo: o livre-pensamento. Um exemplo entre muitos: Pio X denuncia os “espíritos fracos” que compactuaram com esta filosofia que duvida de tudo e, por assim dizer, mergulha tudo nas trevas: abraçaram o agnosticismo juntamente com seu cortejo variado de doutrinas absurdas e sistemas multiplicados ao infinito, uns em oposição aos outros.[26] 
O cientificismo: sigamos o encadeamento das diferentes fases do ensinamento de Pio X:
– Ele começa por afirmar que a ciência é necessária e que o progresso é louvável: “exaltam-se com razão os progressos da civilização”.[27]
– Em seguida, lembra que a própria Igreja, contrariamente às calúnias de que foi alvo, nunca os negligenciou nem entravou, mas, ao contrário, os encorajou. Acusa-se injustamente [a Igreja] de apegar-se a velhas doutrinas, de pôr obstáculo aos progressos das ciências, de cortar as asas de todas as inteligências privilegiadas, de opor-se aos que ensinam a verdade. Não se pode imaginar nada mais falso nem mais injusto.[28]
“A história da religião cristã com eternos testemunhos reduziu [essa acusação] a nada.”[29]
– Mas, se fé e razão, Revelação e leis naturais, verdades sobrenaturais e verdades naturais são compatíveis, “tendo todas a mesma origem e a mesma fonte, que é Deus”,[30] há entre elas uma hierarquia necessária, estando as segundas por essência submetidas às primeiras, de modo que, de todas as ciências, a primeira é a teologia.[31]
– Eis por que Pio X não pode admitir a teoria modernista segundo a qual haveria liberdade total da ciência em relação à fé, nem, muito menos, a fortiori, a teoria segundo a qual haveria subordinação da fé à ciência:
Não pode haver liberdade total da ciência em relação à fé. [...] E, apesar de as terem considerado estranhas uma à outra, [não pode haver] subordinação da fé à ciência.[32]
– Não nos esqueçamos das numerosas advertências de Pio X contra a tentação do orgulho, por exemplo, na encíclica Communium rerum, V, 52 e 54, e contra as aparências enganosas das “palavras grandiosas e sedutoras, repetidas mil vezes, como é o caso da expressão ‘progresso da humanidade’”.[33]
– Aparecem então os limites da ciência e do progresso: são os próprios limites da inteligência e da ordem natural, o orgulho daqueles que não os reconhecem. Em contrapartida, aparecem as necessidades ligadas ao verdadeiro progresso científico: a humildade para reconhecer os limites da inteligência, a necessidade, para os cristãos, de uma subordinação da ciência à fé, pois a verdadeira ciência [a inteligência], a necessidade de unir numa santa aliança estas duas filhas do mesmo pai, a razão e a fé, pelas quais todos vivemos, [...] são [...] duas asas que nos elevam ao conhecimento de toda a verdade.[34]  
Se estendemos demasiadamente este capítulo do cientificismo, é certamente por sua dramática atualidade, em especial no domínio das ciências biológicas.
O laicismo: expressão do idealismo e do racionalismo, cuja falsa neutralidade e verdadeira finalidade Pio X denuncia: “Combater a religião.” A Igreja sempre sofreu perseguições, mas desta vez as armas mudaram: “Eis uma nova fase da eterna guerra declarada contra Deus; não há aí nada de novo, somente as armas empregadas.”[35]
Os socialismos: Já em 1896 o cardeal Sarto estabelecia as ligações entre o liberalismo e as doutrinas socialistas. “As detestáveis e perniciosas doutrinas e os princípios subversivos do liberalismo, e de seus dignos filhos, o socialismo e a anarquia…” Esses erros não poupam os católicos seduzidos pelo idealismo do Sillon, que Pio X denuncia: “Sim, certamente, pode-se dizer que o Sillon escolta o socialismo, com os olhos fixos em uma quimera.”[36] Pio X previne então a sociedade contra “a tirania invasora do socialismo”,[37] que conduzirá ao totalitarismo, precisando em relação aos católicos: só à luz das doutrinas cristãs [...] podereis opor-vos eficazmente ao progresso do socialismo, que [...] avança ameaçador para destruir o edifício da sociedade, já abalado.[38]
      Apesar disso, o Papa não exclui o papel do Estado em matéria econômica e social para “possibilitar a toda a gente de boa vontade sua legítima porção de felicidade temporal”.[39]
As respostas de Pio X
O que Pio X propõe então em contrapartida a essas teorias condenadas? Podemos resumir seu ensinamento em três grandes idéias:
– Lembrar-se incessantemente da primazia da ordem sobrenatural,
em virtude da qual tudo i que há de racionalismo e naturalismo no mundo é arrancado pela raiz e destruído, restando à sabedoria cristã essa glória de ter conservado e defendido a verdade.[40]
– Mas Pio X opõe igualmente a esse idealismo, de onde procedem as teorias liberais, um sólido realismo filosófico e político. O liberalismo é um idealismo; a doutrina católica tradicional é profundamente realista: é claro, não se trata de realismo materialista, mas de um realismo que reconhece como reais tanto as verdades naturais quanto as sobrenaturais.
– Ora, os liberais e modernistas desviam-se constantemente dessas realidades pelo “espírito de novidade” que os caracteriza e que Pio X denuncia, sem concessão, nos “retratos psicológicos”. O ensinamento político e social de Pio X é rico em exortações cortantes, às vezes irônicas, sobre a atração inconsiderada pelas novidades que ele constata em bom número de seus contemporâneos. Aparece assim, nos diversos textos, uma verdadeira “mentalidade liberal” caracterizada pelo “gosto das novidades”, “sentimento sonhador e utópico”, “atração pelas aparências sedutoras”, “excessiva confiança em si mesmo”, etc. Pio X denuncia também a “capacidade de se desviar”, “uma alma fugidia”, “os loucos sonhos” de espíritos “iludidos por vãs esperanças”[41] desses liberais e modernistas.
      Daí a necessidade de, entre outras coisas, precaver-se contra as aparências enganosas que fervilham na linguagem moderna. Pio X, por exemplo, convida os católicos a desconfiar de uma linguagem atraente que, escondendo o vago das idéias e o equívoco das expressões sob o ardor dos sentimentos e a sonoridade das palavras, pode inflamar os corações para causas sedutoras.[42]


II. A DOUTRINA POLÍTICA DE PIO X

7 de julho de 2011

O Calvário e a Missa

Salve Maria!

Fiz uma resumo do livro "Calvário e a Missa" do Arcebispo Fulton J. Sheen. Simplesmente um texto espetacular que vale muito a pena ler até o fim, a cada palavra lida este texto tirava de mim um suspiro de admiração ...






Há certas coisas na vida que são demasiado belas para serem esquecidas como, por exemplo, o amor de mãe. O retrato daquela que nos deu o ser é para cada um de nós uma espécie de tesouro.

O amor dos soldados que sacrificaram as suas vidas pelo seu país é também demasiadamente belo, por isso, prestamos homenagem à sua memória.

A maior bênção, porém, de quantos vieram ao mundo, foi, certamente, a visita do Filho de Deus, sob a forma humana. À Sua vida, superior a todas as vidas, é demasiadamente bela para ser esquecida, e é por isso que exaltamos a divindade das Suas palavras na Sagrada Escritura, e a caridade dos Seus feitos nas nossas ações de cada dia.

Infelizmente, algumas almas limitam-se apenas a estas lembranças quando, na verdade, por muito importantes que sejam essas palavras e ações, não são a maior característica do Divino Salvador.

O ato mais sublime da história de Cristo foi a Sua Morte.

A morte é sempre importante porque sela um destino. Qualquer homem moribundo representa um cenáculo, e este é sempre um lugar sagrado. A literatura do passado deu especial relevo às emoções que rodeiam a morte, e é essa a razão pela qual ela nunca passou de moda. De todas as mortes registradas no mundo dos homens, nenhuma, no entanto, foi tão importante como a
morte de Cristo.

Todo aquele que nasceu veio ao mundo para morrer.

A morte foi um triste ponto final para a vida de Sócrates, mas foi uma coroa para a vida de Cristo. Ele próprio nos disse que veio “para dar a Sua vida pela redenção de muitos”. Ninguém poderia tirar-Lha, mas Ele podia dá-la
voluntariamente.

Se, portanto, a morte foi o principal momento para o qual Cristo viveu, ela foi também a única coisa pela qual Ele quis ser lembrado. Jesus não pediu aos homens que registrassem as Suas palavras numa Escritura, nem tão pouco que a Sua bondade para com os pobres ficasse gravada na história; mas pediu que os homens recordassem a Sua morte. Para que essa memória não fosse entregue ao acaso das narrativas humanas, Ele próprio instituiu a maneira como devia ser lembrada. Essa memória foi instituída na noite anterior à Sua morte e, desde então, se chamou “A Última Ceia”. Tomando o pão nas Suas mãos, Jesus disse: “este é o Meu Corpo que se dá por vós; fazei isto em memória de Mim.
Tomou também depois, da mesma maneira, o cálice, dizendo: “Este é o cálice do Novo Testamento em Meu Sangue que será derramado por vós (S. Lucas, 22,19-20).

E, assim, num símbolo incruento da separação do Sangue e do Corpo, pela consagração do Pão e do Vinho, Cristo oferece-Se à vista de Deus e dos homens, e representou a Sua morte que devia ocorrer às três horas da tarde do dia seguinte. Ele oferecia-Se para ser imolado como vítima, e para que os homens nunca esquecessem que jamais homem algum dera maior prova de amor do que Aquele que renunciava à vida, em favor dos Seus amigos, e deu à Igreja esta ordem divina: “Fazei isto em memória de Mim”.

No dia seguinte, Jesus realizou em toda a plenitude a cerimônia simbólica da véspera, pois foi crucificado entre dois ladrões; e o Seu sangue foi derramado pela redenção do mundo.
A Igreja que Cristo fundou, não só preservou a palavra que Ele proferiu como ainda o ato que praticou, no qual nós recordamos a Sua morte na Cruz, e que é o Sacrifício da Missa – memória da Última Ceia e prefiguração da Paixão de Jesus.

Por esta razão, a Missa é, para nós, o ato culminante da amizade cristã.

O púlpito, onde as palavras de Jesus são repetidas, não nos une a Ele; o coro, no qual os suaves sentimentos são cantados, não nos aproxima tanto da Sua Cruz. Um templo sem altar de sacrifício não existiu entre os próprios povos primitivos, e nada significa entre os cristãos. Na Igreja Católica é, pois, o altar, e não o púlpito, ou o coro, ou o órgão, que representa o centro de amizade, pois é ali que se renova a memória da Paixão. O valor do ato não depende daquele que o celebra, mas sim e apenas do Sumo Sacerdote e Vítima, Nosso Senhor Jesus Cristo. Ali estamos unidos com Ele, a despeito da nossa insignificância; de certa maneira, perdemos a nossa individualidade, durante aquele espaço de tempo; unimos o nosso espírito, a nossa vontade, o nosso corpo, a
nossa alma e o nosso coração tão intimamente com Jesus que o Pai Celeste não é a nossa imperfeição que vê, pois contempla-nos através de Aquele que é o Seu Filho Bem-Amado, no qual Ele pôs toda a Sua complacência.

A Missa é o maior acontecimento da história da humanidade: o único Ato sagrado que afasta a ira de Deus de um mundo pecador, porque eleva a Cruz entre a terra e o Céu, renovando assim aquele decisivo momento em que a nossa triste e trágica humanidade viu desenrolar-se na sua frente o caminho para a plenitude da vida sobrenatural.

O que é importante acentuar é a atitude mental que cada um de nós deve adotar perante a Missa, não encarando o Santo Sacrifício da Cruz como um acontecimento ocorrido há mil e novecentos anos, mas sim como um fato acontecido em todas e cada uma das ocasiões em que a ele assistimos.
Esse acontecimento não pertence ao passado, pois é um drama permanente, sobre o qual o pano ainda não desceu. Não, não pensemos que o fato ocorreu há muito e não nos diz, portanto, mais respeito do que qualquer outro fato ocorrido no passado.

O CALVÁRIO PERTENCE A TODOS OS TEMPOS E A TODOS OS LUGARES

E foi por isso que Jesus, quando subiu ao alto do Calvário, estava praticamente despojado das Suas vestes. Ele poderia ter salvo o mundo sem ter revestido os atavios de um mundo transitório. A Sua túnica pertencia ao tempo, e localizava, fixava Jesus como um habitante da Galiléia. Agora, porém, despojado das Suas vestes e completamente desapossado das coisas terrenas, Ele não pertencia à Galiléia, nem a qualquer província romana, mas sim ao mundo. Jesus transformara-Se no pobre homem universal, que não pertencia a qualquer povo, mas sim a todos os povos.

Para exprimir com maior amplitude a universalidade da Redenção, a cruz foi erguida nas encruzilhadas da civilização, num ponto central, entre três grandes culturas – Jerusalém, Roma e Atenas, em nome das quais Ele fora crucificado. A cruz foi, assim, erguida perante os olhos dos homens para chamar a atenção do negligente, fazer apelo ao desleixado, e despertar as consciências adormecidas. Foi o único fato irrefutável ao quais as culturas e civilizações do Seu tempo não puderam resistir, e é também nos nossos tempos o único fato irrefutável que não podemos deixar de aceitar.

Os personagens que tomaram parte do drama da cruz foram os símbolos de todos aqueles que crucificaram. Nós estivemos lá, nas pessoas dos nossos representantes. Os que atualmente fazemos ao Cristo Místico fizeram-no eles ao Cristo histórico, em nosso nome. Se temos inveja dos bons, fomos representados pelos Escribas e Fariseus. Se hesitamos em abraçar a Verdade e o Amor Divino, receando perder algumas vantagens temporais, estivemos lá, na pessoa de Pilatos. Se a nossa confiança é baseada na força material e procuramos conquistar o mundo por meio dela, em vez de o fazermos através da força espiritual, fomos representados por Herodes. E, assim, a história continua, e implica em si todos os pecados característicos do mundo, pecados que nos cegam para o fato de que Jesus é Deus. Havia, portanto, uma irrefutável certeza na crucifixão. Os homens que tinham a liberdade para pecar, também a tinham para crucificar.

Nosso Senhor, pregado na Cruz, viu a Sua eterna vontade, todo o drama da história, a história de cada alma e a hora em que cada uma delas reagiria perante a Sua crucifixão; embora, porém, Ele visse tudo, nós não poderíamos saber como reagiríamos perante
a Cruz, antes que as nossas vidas tivessem sido projetadas sobre a tela do tempo. Nós não tínhamos a consciência de havermos estado presentes no Calvário, naquele dia, mas Jesus tinha a consciência da nossa presença. Hoje, todavia, sabemos qual o papel que desempenhamos no cenário do Calvário, pela maneira como vivemos e agimos no cenário do Século Vinte.

Não é possível fugirmos à cruz, a não ser que façamos o que fizeram os Fariseus ou vendendo Cristo, como o fez Judas, ou crucificando-O, tal como fizeram os seus carrascos. Todos nós vemos a Cruz, quer para abraçá-la, para nos salvarmos, quer fugindo dela, para nos perdermos.

Como é, porém, que a cruz se torne visível?

Como se perpetuou e renovou o cenário do Calvário?

No Santo Sacrifício da Missa, porque, quer no Calvário, quer durante o Santo Sacrifício, o Sacerdote e a Vítima são os mesmos. As sete palavras derradeiras são idênticas às sete partes da Missa. Assim como as sete notas musicais comportam uma infinita variedade de harmonias e combinações, também na Cruz há sete notas divinas que o Cristo moribundo fez soar através dos séculos e que, no seu conjunto, constituem a sublime melodia da Redenção do mundo.

Cada palavra é uma parte da Missa.

A primeira, "Perdoai-lhes", representa o Confiteor; a segunda, "Hoje estarás comigo no paraíso", é o Ofertório; a terceira, "Mulher, eis aqui o teu filho", é o Sanctus; a quarta, "Por que me abandonaste?", é a Consagração; a quinta. "Tenho Sede", é a Santa Comunhão; a sexta, "Tudo está consumado", é o "Ite missa est"; a sétima, "Pai, nas Vossas mãos entrego o Meu espírito", é o Último Evangelho.

Representai, pois, na vossa idéia, o Sumo Sacerdote, Cristo, saindo da sacristia do Céu para o altar do Calvário. Ele já se revestiu da nossa natureza humana, colocou no braço o manípulo do nosso sofrimento, a estola do sacerdote, a casula da Cruz. O Calvário é a Sua Catedral; a rocha do Calvário é a pedra do altar; o rubor do sol poente a lâmpada do Santuário; Maria e João são as imagens vivas dos altares laterais; a Hóstia é o Corpo de Jesus; o vinho o Seu sangue. Ele está de pé, como sacerdote, e prostrado, como vítima.

A Sua Missa vai começar.

Confissão (Confiteor):

A Missa principia com a confissão. A confissão é uma prece na qual confessamos os nossos pecados e pedimos à Nossa Mãe Santíssima e aos Santos para que intercedam junto de Deus pelo nosso perdão, pois apenas os limpos de coração poderão ver a Deus.

Nosso Senhor inicia também a Sua Missa com a Confissão, embora ela seja diferente da nossa neste ponto: Ele é Deus e, portanto, sem pecado. “Qual de vós me argüirá
de pecado?” A sua Confissão não pode, portanto, ser uma prece pelo perdão dos Seus pecados, mas sim uma oração pelo perdão dos nossos pecados.

O Amor Incarnado esquece a angústia e, naquele momento da agonia concentrada, revela algo na altura, da profundidade e inspiração do maravilhoso amor de Deus, quando Jesus pronuncia a sua Confissão: “Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem”.

Ele não disse “Perdoa-Me”, mas sim “perdoai-lhes”. O momento da morte era, certamente, o mais adequado para provocar a confissão do pecado, porquanto a consciência, na solenidade das últimas horas, afirma a sua autoridade. Nem sequer esboço de contrição se escapou dos Seus lábios. Jesus associou-Se aos pecadores,
mas nunca Se associou ao pecado. Tanto na morte como na vida, Ele nunca teve a consciência de ter descurado um único dever para com Seu Pai Celestial. E por quê? Porque um homem imaculado, absolutamente isento de culpa, é algo mais que um homem – é Deus. E é nisso que reside à diferença.

Não há redenção para os anjos caídos. As gotas de sangue que caem da Cruz, na Missa de Sexta-Feira Santa de Cristo, não tombam sobre as suas cabeças. E por quê? Porque eles sabiam o que faziam. Eles previam as conseqüências dos seus atos, tão claramente como nós vemos que dois mais dois são quatro, e que uma coisa não pode existir e deixar de existir, ao mesmo tempo. Verdades desta natureza, uma vez compreendidas, não
podem ser refutadas, pois são irrevogáveis e eternas.

Conosco, no entanto, é diferente. Nós não vemos as conseqüências dos nossos atos com a mesma clareza, porque somos mais ignorantes que os anjos.

É apenas a nossa ignorância do infinito amor do Sagrado Coração que nos abrange na prece da Sua Confissão, pronunciada do alto da Cruz: “Pai, perdoai-lhes porque eles não sabem o que fazem.” Estas palavras devem ser gravadas no íntimo das nossas almas, e não constituírem desculpa para a nossa reincidência no pecado, mas serem, antes, um motivo de contrição e penitência.

O perdão não é uma negação do pecado. Nosso Senhor não nega o horrível fato do pecado, e é precisamente neste ponto que o mundo erra, pois considera-o como que um retrocesso ao processo evolucionário, uma sobrevivência de influências do passado e identifica-o com a verbosidade psicológica. Numa palavra, o mundo moderno nega o pecado.
Nosso Senhor lembra-nos que ele é a mais terrível de todas as realidades.

Jesus, que amou os homens até a ponto de morrer por eles, permitiu que o pecado exercesse a sua vingança sobre Ele, para mostrar todo o horror representado pela crucifixão de Aquele que mais amava. Aqui, não há, portanto, negação do pecado; a despeito de toda a monstruosidade que ele representa, a Vítima perdoa. A morte de Jesus revela a suprema depravação do pecado, mas tem também a marca de perdão divino. Sendo assim, não há homem que, olhando para um crucifixo, possa afirmar que o pecado não uma coisa grave, nem também possa asseverar que ele não tem perdão.

Pela maneira como sofreu, Jesus revelou a realidade do pecado. Pela maneira como suportou os seus tormentos, Ele revela a Sua compaixão pelo pecador. Ele é a Vítima que sofreu e perdoa. Assim na Vítima, tão humanamente bela, tão divinamente adorável, qualquer de nós pode recordar um Grande Crime e um Grande Perdão. Sob o escudo, que é o Preciosíssimo Sangue de Cristo, podem abrigar-se os maiores pecadores, pois esse sangue tem o poder de sustar as marés da vingança que ameaçam submergir o mundo.
O mundo pode explicar o pecado à sua maneira e desculpá-lo; só, no Calvário, podemos encontrar o perfeito conhecimento da divina contradição do pecado perdoado.

Ofertório:

Chegamos agora ao Ofertório da Missa, pois Nosso Senhor oferece-Se ao Seu Pai Celestial. Para nos lembrar, porém, que não Se oferece sozinho, mas sim em união conosco, Ele junta à Sua oferta a alma do ladrão crucificado à Sua direita. Para que a Sua ignomínia fosse mais completa, num golpe de maldade suprema, crucificaram-nO entre dois ladrões.

Durante a Sua vida, Jesus andara entre os pecadores; foi, pois, entre eles que Lhe ergueram a Sua cruz. O Salvador modificou o quadro, e fez dos dois ladrões dois símbolos - a ovelha e o bode - representando assim aqueles que estarão à Sua direita e à Sua esquerda, quando Ele descer, por entre as nuvens do Céu, com a Sua Cruz triunfante, a julgar os vivos e os mortos.

Ambos os ladrões, a princípio, revoltaram-se e blasfemaram; mas um deles, aquele a quem a tradição chamou Dimas, voltou a sua cabeça para ler na face do Salvador crucificado a resignação e a dignidade. Tal como um pedaço de carvão arremessado ao fogo se transforma numa brasa resplandecente, luminosa, também a alma escura daquele ladrão, arremessada às chamas da crucificação, se abrasou no amor do Coração Divino.

Enquanto o ladrão da esquerda dizia: "Se és o Cristo, salva-Te e salva-nos", o ladrão
arrependido censurava-o; "Não temes a Deus, visto que sofreste a mesma condenação. Nós padecemos justamente, ao passo que este homem nenhum mal praticou". Este mesmo ladrão proferiu então uma prece, não para solicitar um lugar nos céus, mas sim e apenas para não ser esquecido. "Lembra-Te de mim, quando estiveres no Teu reino".
Tal tristeza e fé não podiam ficar sem recompensa. Naquela ocasião, em que o poderio de Roma não conseguiu que Jesus falasse, quando os Seus amigos julgavam que tudo estava perdido, e em que os Seus inimigos se julgavam vencedores, o Salvador quebrou o silêncio. Ele, o Crucificado, transformou-Se em Juiz; Ele, o Crucificado, transformou-Se no Divino Protetor de almas: "Eu te digo, hoje estarás comigo no Paraíso".

Por meio dessas palavras, Nosso Senhor, que estava a oferecer-Se a Seu Pai, como grande holocausto, juntava à Sua oferta, na patena da Cruz, a primeira hóstia humilde, jamais oferecida na Missa - a hóstia do ladrão arrependido; uma brasa tirada da fogueira; um feixe desprezado, esquecido pelos ceifeiros da terra; o grão moído da crucificação e transformado em pão pela Eucaristia. O Salvador não sofre sozinho na Cruz, pois sofre conosco. E foi essa a razão pela qual Ele uniu o sacrifício do ladrão ao Seu próprio sacrifício. É o que significam as palavras de São Paulo quando diz que devemos sofrer
aquelas penas que são necessárias aos sofrimentos de Cristo.
Nem todos os ladrões que existem na história do mundo reconheceram as suas culpas, nem tampouco pediram para ser lembrados. Nosso Senhor está agora no Céu e já não pode, portanto, sofrer na Sua natureza humana, mas pode padecer ainda mais nas nossas naturezas humanas e pede-nos que, à semelhança do bom ladrão, nos unamos a Ele na Cruz, para que, participando da Sua Crucificação, possamos participar da Sua Ressurreição e da Sua glória celestial.

Quais as condições que nos “transformam” em pequeno holocausto no Sacrifício da Missa? Como pode o nosso sacrifício unir-se ao de Cristo e ser aceito, como sucedeu com o ladrão?

Apenas reproduzindo nas nossas almas as duas atitudes que a alma do bom ladrão manifestou; penitência e fé. Antes de mais, façamos penitência, dizendo: "Eu mereço castigo pelos meus pecados. Preciso fazer penitência". Quantos ignoram até que ponto tem sido cruéis e ingratos para com Deus! E, se assim é, não deveríamos queixar-nos das mágoas e reveses da vida. Quantos mais contritos formos, tanto menos esforços faremos para fugir à nossa cruz. Quanto mais reconhecermos o que somos, mais convictos diremos, como o bom ladrão: "Eu mereci esta cruz". Ele não pediu para ser desculpado, nem para lhe serem atenuadas as culpas, nem tampouco para ser libertado ou despregado do madeiro de suplício. Ele pediu apenas para ser perdoado. Ele fez penitência porque aceitou o seu holocausto, a sua cruz.

Se os nossos corações não estiverem despedaçados pela tristeza, se não reconhecermos que estamos realmente feridos, como poderemos sentir necessidade de ser consolados e curados? Se não tomarmos a nossa parte de dor na Crucificação, como poderemos pedir que os nosso pecados nos sejam perdoados?

A segunda condição que nos permite ser uma hóstia no ofertório da Missa, é a fé. O ladrão, olhando por sobre a cabeça de Jesus, leu a palavra rei. Estranho Rei aquele, que estava coroado de espinhos, e cuja púrpura real era o próprio sangue, tinha por trono uma cruz, por cortesãos os seus carrascos, e fora coroado na crucificação!

A despeito de todos aqueles horrores, o ladrão viu o "ouro" e ergueu a sua voz, a sua prece, acima de todas as blasfêmias. A sua fé era tão forte que ele aceitava, contente, a sua cruz. O ladrão crucificado à esquerda pedia para ser despregado; mas não o da direita, porque ele sabia que há males maiores do que a crucificação, e outra vida para além da cruz. Ele tinha fé no Homem da Cruz central, pois sabia que ele poderia, se quisesse, transformar
os espinhos em grinaldas e os pregos em flores. Ele acreditava no Reino que fica para além da Cruz, e sabia que os sofrimentos deste mundo são insignificantes, comparados com as alegrias futuras.

Ele disse como o salmista: "Embora eu siga por entre as sombras da morte, não receio o mal, porque o Senhor está comigo". Tal fé assemelhava-se à dos três jovens na fornalha ardente, à qual o rei Nabucodonosor os condenara, por se terem recusado a adorar a estátua de ouro. A resposta dos mancebos foi esta: "Deves saber, ó rei, que o Deus a quem adoramos pode tirar-nos da fornalha de fogo ardente e livrar-nos das tuas mãos. E, se
Ele o não fizer, fica tu sabendo, ó rei, que nós não honramos os teus deuses, nem adoramos a estátua de ouro que erigiste".

E, depois de dizerem isto, eles entregaram-se nas mãos de Deus e confiaram n'Ele como Jó. Também o bom ladrão sabia que Nosso Senhor podia libertá-lo, mas não Lhe pediu que o retirasse da cruz, pois também Jesus não Se retirava a Si próprio, embora os Seus carrascos escarninhos O desafiassem a isso.

Isto não queria dizer que o bom ladrão não amasse a vida, porque ele amava-a como todos nós a amamos. Ele desejava a vida, mais a vida eterna que, finalmente, obteve. Também é dado a cada um de nós descobrir essa Vida, mas só entraremos nela por meio da penitência e da fé que nos une à Grande Hóstia - ao Sacerdote e Vítima que é Cristo. Desta maneira nos transformaremos em ladrões espirituais, para, mais uma vez, nos apoderarmos do Céu.

Sanctus:

Cinco dias antes, Jesus fizera a Sua entrada triunfal em Jerusalém. Aos Seus ouvidos soavam gritos de triunfo; o chão que os Seus pés pisaram foi juncado de folhas de palmeira, e nos ares ecoaram aclamações ao filho de David, e louvores ao Sagrado Filho de Israel. Àqueles que se mantiveram silenciosos durante as demonstrações feitas em Sua honra, Nosso Senhor lembrou que se as suas vozes não se faziam ouvir, as próprias pedras
falariam por eles. Esse foi o dia de nascimento das catedrais góticas.

Eles não conheciam a verdadeira razão pela qual Lhe chamavam Sagrado, nem tampouco compreendiam o motivo que levava Jesus a aceitar o tributo dos seus louvores. Eles pensavam que aclamavam uma espécie de rei da terra. Jesus aceitou essas demonstrações porque ia ser o Rei de um império espiritual. Ele aceitou os seus tributos, as suas aclamações e exclamações de louvor porque caminhava, como uma vítima, ao encontro da Sua Cruz.

– Sanctus, Sanctus, Sanctus.

Cinco dias depois, verificou-se o “Sanctus” da Missa do Calvário; mas naquele “Sanctus” da Sua Missa, Jesus dirigiu-Se àqueles que já eram santos – a Sua querida Mãe e ao Seu bem-amado discípulo João. Palavras tocantes foram essas: “Mulher eis aqui o teu filho... Eis aqui a tua Mãe!”. Falando agora aqueles que já eram santos, Jesus não carecia da divina intercessão, pois Ele era o Filho de Deus. Nós, todavia, precisamos de santidade, pois cada vítima da Missa deve ser santificada, impoluta.

Como podemos, porém, ser os santos participantes do Sacrifício da Missa?
Segundo a própria resposta de Jesus, consegui-lo-emos colocando-nos sob a proteção da Sua Mãe Santíssima. Ele dirige-Se à Igreja e a todos os seus membros, representados na pessoa de João, e diz a cada um de nós: “Eis a tua mãe”.
Por que foi, porém, que Jesus se dirigiu a Maria, chamando-lhe Mulher, em vez de Mãe? É que ela era agora a Mãe de todos os cristãos, e a Sua missão era universal – Mãe do Corpo Místico da Igreja, Mãe de todos nós.

Há um tremendo mistério oculto naquela palavra “Mulher”. Essa foi, realmente, a última lição de renúncia que Jesus deu a Maria, e a primeira lição de um novo laço. Nosso Senhor alienara gradualmente a Sua afeição por Sua Mãe, não porque a amasse menos, mas sim e apenas porque ela tinha agora mais a quem amar. Maria desprendia-se da maternidade da carne, para se prender mais à grande maternidade do espírito. Daí, o
emprego da palavra "Mulher". Ela havia de fazer de nós outros tantos Cristos, porque fora ela quem criara o Filho de Deus. Só Maria podia transformar-nos em criaturas santificadas, dignas de pronunciar o Sanctus, Sanctus, Sanctus da Missa do Calvário.
A história de preparação para o papel de Mãe do Corpo Místico de Cristo, está representada nas três cenas da vida do Seu Divino Filho, as três lições reveladas no drama do Calvário, principalmente aquela em que Maria foi chamada a ser, não apenas a Mãe de Deus, mas também a mãe dos homens, não apenas a mãe daqueles que já eram santos, mas também daqueles que pediam para ser santificados.

A primeira teve lugar no Templo, onde Maria e José encontraram Jesus, depois de O terem procurado durante três dias. Sua amada Mãe disse-Lhe que os Seus corações tinham sofrido deveras durante aquela angustiosa procura, ao que Jesus respondeu: “Não sabes que devo ocupar-Me das coisas de Meu Pai?”

Nestas palavras, Jesus queria significar: “Tenho outra missão, além do trabalho da oficina de carpinteiro. Meu Pai mandou-Me a este mundo para a suprema tarefa da Redenção, por meio da qual todos os filhos dos homens serão filhos adotivos do Meu Pai celestial, tornando-se, assim, membros da grande irmandade de Cristo, o Seu Filho”. Quem poderá dizer quanta luz estas palavras derramaram sobre Maria? Também não sabemos se Ela compreendeu então que a Paternidade de Deus havia de confiar-Lhe o título de mãe dos homens. Dezoito anos depois, na festa das bodas de Cana, Maria teve, porém, pleno conhecimento de tal missão.
Como é consolador pensarmos que Jesus, pregando a penitência, e insistindo para que tomássemos a nossa cruz diariamente e O seguíssemos, iniciasse a Sua vida pública, assistindo a uma boda!
Que maravilha compreensão dos corações humanos!
Quando, no decorrer do banquete, o vinho se acabou, Maria, sempre solicita para com aquele que A rodeavam, foi a primeira a reparar e a procurar o remédio para aquela falta. Ela limitou a dizer a Nosso Senhor:
“Não tem vinho”; e Ele respondeu:
“Mulher, e o que importa isso, a mim ou a ti?”
Jesus não A tratou por Mãe, mas sim por Mulher, o mesmo título que Lhe dera três anos antes.
Jesus queria dizer-Lhe: “Queres que faça algo que Me pertence, como Filho de Deus; pedes-Me que faça um milagre que só Deus pode fazer; pede-Me que exerça a minha divindade que se relaciona com a espécie humana, principalmente como seu redentor. Quanto a divindade operar pela salvação do mundo, Vós serás não apenas minha mãe, mas também a mãe da humanidade redimida. A Vossa maternidade física exercer-se-á no
mundo mais vasto da maternidade espiritual, e é essa a razão pela qual Vos chamo mulher”.
Depois, para provar o poder da intercessão de Maria no Seu papel de mãe universal, Ele ordenou que enchessem as brilhas de água e operou-se o primeiro milagre: “As águas, conscientes, viram o seu Deus e coraram”.
A terceira cena ocorreu dois anos depois. Um dia, enquanto Jesus pregava, alguém O interrompeu, para dizer:
“Vossa mãe não cessa de procurar-Vos”, ao que Jesus respondeu: “Quem é minha mãe?” E, estendendo as mãos para os Seus discípulos, disse: “Contemplai minha mãe e meus irmãos, pois todo aquele que fizer a vontade de Meu Pai que está no céu, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.

O significado destas palavras é irrefutável. Há uma maternidade espiritual e parentescos que não são carnais, nem laços de sangue, mas sim ligações do espírito que nos unem ao Reino Supremo, à Irmandade de Cristo. Estas três cenas tiveram o seu clima junto à Cruz onde Maria recebeu o título de “Mulher”. Foi essa a segunda Anunciação.

Também Cristo e Sua Mãe deram origem, na Cruz, à Sua descendência espiritual, que somos nós – os filhos de Maria, ou membros do Corpo Místico de Cristo. Maria teve o Seu primogênito em Belém. Note-se que São Lucas chama a Nosso Senhor primogênito, não
porque Maria tivesse outros filhos, segundo a carne, pois a Sua segunda maternidade seria de caráter espiritual.

Nós somos filhos de Maria. - literalmente, filhos. Ela é nossa mãe, não por título de ficção, nem de cortesia; ela é nossa mãe porque sofreu naquele momento memorável, e por todos nós, as dores da maternidade. E porque é que Deus quis que ela fosse nossa mãe? Porque Ele sabia que, sem a sua proteção e auxílio, jamais seríamos santificados. Jesus veio até nós por intermédio da pureza de Maria, e só através da pureza de Maria conseguiremos chegar até junto d'Ele.

Sem Maria, não há, porém, santificação.

Note-se que quando tal palavra foi dirigida a Maria, estava prostrada junto à Cruz, uma outra mulher. Já repararam que, praticamente, todas as imagens tradicionais da Crucifixão representam sempre Madalena ajoelhada aos pés da Cruz?
Nunca vimos, no entanto, uma imagem de Maria prostrada. João estava presente e refere no seu Evangelho que ela estava de pé. E por quê? Porque era a posição que lhe competia no papel que ali desempenhava, em relação a nós. Maria, a nossa Mãe.

Se Maria estivesse prostrada por terra, naquela hora, tal como Madalena, se ela tivesse sequer chorado, a sua mágoa teria tido um lenitivo. As dores que não desatam, esmagam o coração. Essa dor foi parte do nosso preço de compra, pago pela nossa co-Redentora, Maria, a Mãe de Deus!

Nosso Senhor deixou-a ficar sobre a terra quando Ele subiu aos céus, para que ela fosse a mãe da Igreja, a nossa mãe. A Igreja, infante ainda, carecia do amparo materno, tal como Jesus quando era menino. E foi assim que Maria permaneceu sobre a terra, até que os seus filhos, a sua família se criassem e desenvolvessem. E foi essa a razão porque a encontramos orando com os Apóstolos, enquanto aguardavam a vinda do Espírito Santo.
Mais tarde, foi para o céu, coroada de Rainha dos Anjos e dos Santos, para assistir a outra boda de Caná e interceder por nós, junto ao Salvador, pois nós éramos seus filhos, irmãos de Cristo, e filhos do Pai Celestial.

A Consagração:

Eis a quarta palavra da Consagração da Missa do Calvário. As três primeiras palavras foram dirigidas aos homens. A quarta, porém, foi dirigida a Deus. Estamos agora na última fase do drama da Paixão. Na quarta Palavra, e em todo o Universo, só existem apenas Deus e Jesus. Esta é a hora das trevas. Subitamente, o silêncio dessa escuridão é quebrado por um grito – tão terrível e tão inesquecível que até aqueles que não compreenderam a língua em que foi expresso hão de recordar-se sempre do tom estranho em que foi proferido: “Eli, Eli, lamma Sabcthany”.

As trevas que cobriam a terra naquele momento representam apenas o símbolo exterior da noite escura da alma. O sol pode esconder a sua face perante o terrível crime dos deicidas, mas a verdadeira razão da noite que se estendeu sobre a terra foi a sombra da Cruz que se erguia no Calvário.

Toda a criação ficou imersa nas trevas da dor.

Qual foi, todavia, a razão do grito que partiu da escuridão?
“Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonastes?”

Esse foi o grito de espanto para o pecado, em que o homem abandonou Deus, em que a criatura esquece o Criador, em que a flor despreza o sol que lhe deu força e beleza. O pecado é uma separação, um divórcio da união com Deus, e do qual derivam todos os divórcios. Desde que Jesus veio a terra para remir os homens dos seus pecados, é certo que Ele sabia que havia de sentir esse abandono, esse apartamento, esse divórcio.

Não havia sombra de pecado na alma de Jesus, embora Ele quisesse sentir os efeitos do pecado, e a terrível sensação de isolamento e solidão – a solidão do afastamento de Deus.
Renunciando à divina consolação que poderia pertencer-Lhe, Ele quis mergulhar na tremenda solidão da alma que se extraviou de Deus pelo pecado, para expiar a solidão do ateu que nega a existência de Deus e deposita a sua fé nas coisas terrenas, a dor do coração despedaçado de todos os pecadores que sentem a amargura da ausência do seu Criador.

Jesus foi até ao ponto de remir todos aqueles que não crêem e que, na tristeza e na miséria, exclamam, blasfemando: “Por que é que a morte levou tal pessoa?”, “Por que é que perdi aos meus bens?”; “Porque é que hei de sofrer”; “Porque tenho que suportar esta gravidez que não planejei?”

O “Por que” que Jesus dirigiu a Seu Pai é uma expiação que abrange os “porquês” soltados por aqueles que blasfemam e com isto pecam.

Para melhor revelar a sensação de tal abandono, Jesus exteriorizou-o. Porque o homem se apartara de Deus, Ele permitiu que o Seu sangue se separasse do Seu Corpo. O pecado entrara no sangue do homem e, como se os pecados do mundo recaíssem sobre Ele, Jesus deixou derramar o Seu precioso sangue, do cálice do Seu Corpo. Quase que podemos ouvi-Lo dizer:
“Pai, este é o Meu Corpo, este é o Meu Sangue. Eles estão separados um do outro, tal como a humanidade se separou de Ti. Esta é a Consagração da Minha Cruz”.

O que aconteceu então no Calvário acontece agora na Missa. Com uma diferença: Na Cruz, o Salvador estava só e, na Missa, está conosco.

Cristo anda no mundo juntando as almas que desejam ser outras tantos Cristos. Para que nos nossos sacrifícios, as nossas tristezas, os nossos calvários, as nossas crucificações, não fiquem isoladas, desunidas, a Igreja reúne-os, junta-os, e o agrupamento, a massa de todos esses sacrifícios humanos reúne-se ao grande sacrifício de Cristo na Cruz, durante a Missa.

Do alto da Cruz, Nosso Senhor já olhava para todos aqueles que haviam de vir, para todos nós, esperando que algum dia nos entregássemos a Ele no momento da consagração. Assistindo à Santa Missa, realizamos, portanto, a esperança que antecipadamente Jesus pôs em nós.

Comunhão:

O Nosso bem-amado Salvador, chega à comunhão da Sua Missa quando, no íntimo do Sagrado Coração, parte este grito: "Tenho sede".

Quando Lhe ofereceram de beber, Ele não aceitou. Era outra, era diferente a sede que atormentava Jesus – era a sede das almas e dos corações humanos. Esse grito foi uma apelo à comunhão - o último da longa série de apelos que o Pastor que é Jesus, dirigiu aos homens. O próprio fato de ter sido traduzido pelo mais pungente de todos os sofrimentos humanos, que é a sede, dá a medida da sua profundidade e da sua força. A humanidade pode sentir-se faminta de Deus, mas Deus sente-Se sequioso da humanidade.

Ele sentiu essa sede na Criação, quando a fez conviver com a divindade no jardim do paraíso, e ainda na Revelação, quando tentou chamar a Si o coração afastado do homem, contando-lhe os segredos do Seu amor. Essa sede renovou-se na Incarnação, quando Jesus Se tornou semelhante àquele que amava, revestindo a forma e as aparências humanas. Na Cruz, o Salvador manifestou a mesma sede na Redenção pelo maior amor que jamais existiu, pois que ofereceu a própria vida por aqueles a quem amava. Esse foi o apelo final para a comunhão, antes de se correr a cortina sobre o Grande Drama da vida de Jesus sobre a terra.

A nossa sede de Deus não encerra algo de misterioso, porque a boca sequiosa suspira pela fonte, a planta volta-se para o sol e os rios correm na direção do mar. Dada, porém, a nossa insignificância e a mesquinhez do nosso amor para com Deus, o amor que Ele nos dedica é, realmente, um mistério. Esse é o significado da sede divina pela Comunhão conosco.

O amor de Deus pelo homem apela, portanto, para a unidade baseada na Incarnação - unidade de todos os homens no Corpo e no Sangue de Cristo. Foi para selar esse amor por nós que Ele Se deu na Sagrada Comunhão, para que, assim como Ele e a Sua natureza humana, nascendo das entranhas da Sua Mãe Santíssima, formaram um só na unidade na Sua Pessoa, também Ele e nós, nascidos das entranhas da humanidade, pudéssemos ser um só na unidade do Corpo Místico de Cristo. E é por essa razão que empregamos a palavra "receber", quando falamos da Comunhão com Nosso Senhor na Eucaristia, pois, literalmente, "recebemos" a Vida Divina, exatamente como a criancinha recebe a vida através de sua mãe. Cada vida é sustentada pela comunhão com uma Vida mais elevada.

A comunhão é, pois, a maneira de recebermos a Vida Divina, à qual não temos mais direito do que a pedra-mármore tem de vir algum dia a dar flor. É apenas uma pura dádiva do Todo-Poderoso que nos amou ao ponto de querer unir-Se a nós, não por meio dos laços da carne, mas sim pelos sagrados laços do Espírito.

A comunhão implica não somente a recepção da Vida Divina mas também a oferta, pois todo o amor é recíproco. Não há amor unilateral, pois, por sua natureza, o amor exige reciprocidade. Deus tem sede de nós, mas isso quer dizer que o homem também tem sede de Deus. Quando vamos receber a Sagrada Comunhão, não devemos nunca esquecer que não vamos apenas "receber" Deus Nosso Senhor, mas sim retribuir também a Sua dádiva, oferecendo-nos a nós próprios na reciprocidade do amor.

Existe ainda um outro aspecto da Comunhão, além da recepção da Vida Divina. São João refere-se a esse aspecto e São Paulo dá-nos essa verdade completamente na sua Epístola aos Coríntios. A Comunhão não é apenas uma incorporação na Vida de Cristo, mas também uma incorporação na Sua Morte.

"Todas as vezes que comerdes este pão e beberdes deste cálice comemorais a morte do Senhor, até que Ele venha".

A vida sobrenatural tem duas faces: a reconstrução, segundo o modelo que é Cristo, e a destruição do velho Adão.

O Domingo de Páscoa pressupõe uma Sexta-Feira Santa. O amor implica uma dádiva mútua que termina na própria recuperação. Assim, a Mesa da Eucaristia é um lugar de troca, e não um lugar de exclusiva recepção.

Acaso poderíamos receber toda a Vida de Cristo, sem Lhe darmos nada em troca? Acaso poderíamos esgotar o cálice, sem contribuir com algo para enchê-lo? Devemos receber o pão, se oferecer o grão que deve ser moído; receber o vinho, sem dar as uvas que devem ser esmagadas? Se durante a nossa vida fôssemos sempre à Comunhão para receber a Vida Divina, e A levássemos conosco, sem deixar nada em troca, seríamos parasitas do Corpo Místico de Cristo.
Devemos, pois, levar conosco, para a Mesa da Eucaristia, o espírito de sacrifício, a mortificação da inferioridade do nosso ser, as cruzes suportadas com paciência, a crucificação do nosso egoísmo, a morte da nossa concupiscência, e, inclusivamente, a nossa falta de merecimentos para receber a Comunhão.

Ite, Missa est:

Restava apenas o cumprimento de uma palavra de David sobre a realização de cada profecia. Agora, porém, que tudo o mais se cumprira. Ele, o verdadeiro David, pronunciava, por último, as palavras do profeta: “Tudo está consumado”.

O que é que estava consumado? Era a redenção do homem, porque o Amor completara a sua missão, o Amor fizera tudo o que pudera.

Há duas coisas que o amor pode fazer. Por sua própria natureza, o Amor pende para a Encarnação, e toda Encarnação pende para a Crucifixão. Pois não é verdade que, na ordem do amor humano, do afeto do marido pela esposa, e da encarnação, da confluência do amor mútuo, nascem novos seres, que são os filhos? E quem poderá jamais esquecer os filhos das suas entranhas, cujo amor vai até ao ponto de fazer por eles os maiores sacrifícios, inclusivamente o da própria vida?

E é assim, porque todo o amor, quando verdadeiro, pende para a crucificação. Isto é, porém, uma pálida comparação com a ordem divina, segundo a qual o amor de Deus pela Sua criatura é tão profundo e intenso que terminou numa Encarnação.

O Amor divino, todavia, não se limitou a revestir a forma humana, pois Nosso Senhor veio ao mundo para remi-lo. A morte era, pois, o alvo supremo, que Ele procurava.
A morte, que interrompe e corta as carreiras dos grandes homens, não interrompe, porém, a Sua, pois Ele foi coroado de glória, e este era o único objetivo que Ele procurava. Assim, a Sua Encarnação pendia para a Crucificação, para o maior amor que jamais alguém sentiu, e que sacrificou a própria vida por aqueles a quem amava.

Consumada a obra da Redenção, o Divino Amor podia dizer: “Dei tudo quanto podia dar, em benefício da minha vinha”. O amor não pode, realmente, dar mais do que a vida por aqueles a quem ama: “Ite, Missa est”. – “Ide, a missa está dita”.

A Sua obra estava, pois, consumada. E a nossa?

Quando o Salvador disse “Tudo está consumado”, Ele não quis dizer que as oportunidades da sua Vida se tinham esgotado, mas sim que a Sua obra estava tão perfeitamente terminada que nada havia a acrescentar-lhe, por muito perfeito que fosse.

Quanto a nós, no entanto, quão longe isto está da verdade! Quantos de nós acabam as suas vidas, sem as terem realmente cumprido! Uma vida de pecado pode chegar ao seu fim, mas nunca poderá dizer-se que foi uma existência concluída, perfeita.
Se a nossa vida se limitou a “acabar”, os nossos amigos perguntarão: “quanto tempo viveu?” Se, porém, a nossa vida foi uma existência que atingiu a sua finalidade, que cumpriu, enfim, a pergunta será esta: “quantos merecimentos de boas obras leva ele consigo?”

Uma vida realmente preenchida não se conta pelo número de anos, mas sim pelas suas obras. Não conta o tempo que se gastou na vinha, mas sim o trabalho que ali ficou feito.
Num curto espaço de tempo pode realizar-se tarefa equivalente a muitos anos, pois os próprios que chegam à décima primeira hora podem viver uma vida completa. Os outros, e até aqueles que vieram até Deus, como o bom ladrão, apenas na hora do seu último suspiro, podem acabar a sua existência no Reinado de Deus. A nenhum deles se aplica a triste exclamação de pesar: “Demasiado tarde Te amei, ó Beleza Eterna”!
Nosso Senhor consumou a Sua obra, mas nós não consumamos a nossa. Ele aponta-nos o caminho que devemos seguir. No final, Ele depôs a Sua Cruz, e nós devemos tomá-la sobre os nossos ombros. Ele consumou a Redenção no Seu Corpo físico, mas cabe-nos a nós consumá-la no Seu Corpo Místico. Ele consumou a Salvação, mas nós ainda a não aplicamos ás nossas amas. Ele terminou a construção do Templo, mas nós devemos habitá-lo. Ele realizou o modelo ao qual devemos adaptar as nossas cruzes. Ele lançou a semente, mas cabe-nos a nós ceifar a seara. Ele encheu o cálice, mas nós ainda não esgotamos o seu conteúdo que refrigera. Ele semeou o campo de trigo, mas nós devemos recolher o grão no nosso celeiro.

Ele consumou o Sacrifício do Calvário; cabe-nos, porém, consumá-lo também, na Santa Missa.

O Último Evangelho:

O último Evangelho da Missa é um formoso paradoxo que nos faz regressar ao princípio, pois abre com as palavras “no princípio”...

Também na vida humana o fim é o princípio de outra vida. A última palavra de Nosso Senhor foi realmente, o Seu último evangelho: “Pai nas vossas mãos entrego o meu espírito”. Tal como no evangelho da Missa, também Ele regressa ao Pai de onde veio. Jesus completara a Sua obra. A Sua missa começara com a palavra Pai, e foi com essa mesma palavra que Ele terminou.

A maneira de reproduzir o quadro do Último Julgamento, durante a Santa Missa, será a evocação da forma como o Pai recebeu e saudou o Seu Filho, olhando para as Suas mãos. Nelas se evidenciavam os vestígios do trabalho, as calosidades da Redenção e as cicatrizes da Salvação.

Também nós, terminada a nossa peregrinação na Terra e no regresso ao princípio, veremos que Deus olha as nossas mãos. Se durante a nossa vida tivermos tocado as mãos do Seu Divino Filho, as nossas mãos apresentarão as marcas dos pregos; se tivermos percorrido a senda que conduz à eterna glória, através das veredas tortuosas e difíceis do Calvário, também os nossos pés apresentarão os mesmos ferimentos; se os nossos corações bateram em uníssono com o de Jesus, também eles ostentarão a chaga do lado, aberta pela lança que trespassou o Coração do Salvador.

Abençoados são, pois todos aqueles que levam nas suas mãos, marcadas pelos cravos da Cruz, o pão e o vinho das suas vidas consagradas, marcadas pelo selo do Amor redentor.

Mal, porém, daqueles que se afastaram do Calvário e que apresentarão as mãos brancas e sem cicatrizes! Quando a vida se acaba, e a Terra se desvanece como um sonho, quando a luz da eternidade entra a jorros nas almas, com todo o seu esplendor, os justos podem com uma fé humilde, mas triunfante, repetir, como num eco, a última palavra de Cristo: “Pai, nas Vossas mãos entrego o meu espírito”! E, assim, termina a Missa de Cristo. O Confiteor foi a Sua oração ao Pai, para que nos perdoasse aos nossos pecados; o Ofertório foi a apresentação das pequenas hóstias, sobre a patena da Cruz; o Sanctus foi a encomendação das nossas almas a Maria, a Rainha de todos os Santos; a Consagração representou a separação do corpo do Salvador e a aparente separação de divindade e humanidade; a Comunhão foi a Sua sede pelas nossas almas; o Ite Missa est foi o remate da obra da salvação; o último evangelho foi o regresso de Jesus a Seu Pai.