31 de agosto de 2011

O ESPÍRITO CONCILIAR ESTENDE A MÃO AO COMUNISMO




Para começar a esclarecer este ponto, vejamos o testemunho de quem viveu esse drama: monsenhor Lefebvre, falando aos jornalistas no aeroporto de Paris, dia 9 de dezembro de 1983:

“(...) Em todo lugar os fiéis nos dizem — mudaram nossa religião, não é mais a religião católica. Estão escandalizados em ver bispos com tendências marxistas. Mas isto não deveria surpreender, porque não se condenou o comunismo durante o concílio e agora não há como condená-lo. É algo absolutamente inaudito na história da Igreja.

Reuniu-se um concílio pastoral, dito pastoral, isto é, para cuidar das almas dos fiéis, da salvação destes e do mundo. Pois bem, ao maior mal, ao mais ignóbil, ao mais dissolvente da sociedade, da pessoa humana, da liberdade, que é o comunismo, foi dito: não o condenaremos durante o Concílio.

“Pessoalmente sei de algo. Fui eu quem, com dom Sigaud, reuniu as quatrocentas e cinqüenta assinaturas de bispos para a condenação do [84] comunismo. Eu mesmo as levei à secretaria do concílio, foram postas numa caixa! E depois tiveram a pretensão de dizer que no concílio não houve nenhum pedido de condenação do comunismo! Havia sido eu mesmo a levar pessoalmente esse documento do qual conservei a lista dos bispos que o subscreveram. É realmente inverossímil. Imediatamente protestei e me foi respondido que não era verdade que haviam sido apresentadas 450 assinaturas. Depois disseram que estas chegaram tarde e que não se sabia onde estavam. Efetivamente haviam decidido que o comunismo não seria condenado, para que pudessem comparecer ao concílio os delegados de Moscou.”

Esse assunto já começou a ser tratado sob o título “Um acordo Montini-Stalin” (p. 51), onde se viu que essa tratativa sinistra, da qual ainda não se conhecem as circunstâncias e da qual jamais se poderá saber tudo, neste mundo, era o início de um processo de compromissos que teria no concílio uma aplicação prática, cujo êxito nos dará idéia do quanto valiam.

Tratava-se de obter a presença no concílio de observadores do patriarcado ortodoxo de Moscou, aliás sabidamente comprometido com o regime soviético. Note-se que os ortodoxos turcos e gregos já haviam decidido que não compareceriam ao concílio reunido em Roma, em 1962, desde que, antes do acordo Roma-Moscou, constava que os russos não iriam. Curiosamente essa solidariedade acabou por deixá-los fora, dada a mudança fulmínea destes, fazendo com que o arcebispo de Atenas os acusasse de haver rompido a “Unidade ortodoxa”. Isto tudo consta do livro Humanismo soviético, do padre Ulisse Floridi, Ed. Agir (p. 225). O mesmo autor escreveu o importante livro Moscou e o Vaticano, editado em muitas línguas. É dito aqui, para mostrar como o interesse ecumênico dos organizadores do concílio era, senão um pretexto, pelo menos muito mais propenso a uma aproximação com os teleguiados de Moscou do que com os patriarcados de Constantinopla e Atenas. Mas há um outro aspecto citado nesse livro que deve ser notado: “No Congresso pan-ortodoxo de Rodes, em 1961, o pedido da delegação russa causou grande impressão: que fosse cancelado da ordem do dia o assunto relativo às missões e ao ateísmo e fosse substituído por aquele referente à luta pela paz e contra o racismo. Falando da unidade das igrejas, o arcebispo Nikodim declarou que a Igreja russa era favorável, mas que ela não podia tolerar que certos ambientes ocidentais, e nomeou o Vaticano, aproveitassem desta aspiração para dela fazer a base ideológica da luta contra os povos empenhados no caminho da democracia (isto é, dos países comunistas!).” (cf. La Croix, 21/10/61)

Ficamos sabendo com isto que o patriarcado de Moscou segue a política de silenciar sobre o ateísmo e indignar-se contra um anticomunismo que ainda via em Roma. Revela-se assim uma “igreja popular-democrática” que tem por porta-voz o jovem Nikodim. Tudo isto po-[85]-de ter assustado os popes orientais, não o papa da Roma conciliar.

Como se viu antes, João XXIII ordenou ao cardeal Tisserant que iniciasse tratativas com Nikodim, que para os serviços secretos ocidentais era um agente da KGB. O mesmo que iria morrer com a idade de 53 anos, em 1978, nos braços de João Paulo I, no Vaticano. Depois que o próprio papa deu explícitas garantias ao governo de Moscou de que não haveria debate sobre o comunismo e menos ainda condenações, essas tratativas foram tão aceleradas que em questão de dias monsenhor Willebrands, depois cardeal e substituto do cardeal Bea, partiu para Moscou disfarçado de executivo sueco, a fim de confirmar as garantias de não anticomunismo do concílio, obtendo assim a partida para Roma dos observadores ortodoxos russos.


Esses fatos e tantos outros detalhes estão registrados nos livros Papa Giovanni, il Papa della Tradizione, de Ernesto Balducci, e Pope John and His Revolution, de E.Y. Hales, e em artigos das revistas Itineraires de 1962, 63 e 84, Approaches de 83 e 84, e Si si no no dos mesmos anos. Como observa Jean Madiran em Itineraires, se sobre os detalhes dessa operação, que deve ser considerada a “vergonha da Santa Sé no século XX”, pode haver algumas dúvidas, sobre a sua atuação que perdura no presente não há nenhuma: o Vaticano deixou desde 1962 de fazer qualquer referência ao comunismo e seus males. No máximo voltou-se a falar das deficiências do marxismo, quando até os socialistas o fazem.

O jornalista católico inglês Gregory Macdonald, num artigo em Approaches, n.º 79, lembra que o Concílio Vaticano II ficou condicionado por essas misteriosas tratativas e diz: “Para aquilatar o significado disso tudo, seria necessário indagar a que ponto estaríamos hoje se, antes do Concílio de Nicéia, o papa tivesse concordado com o imperador, que não seria discutida a heresia de Ário. A promessa a um poder civil que venha a coagir os trabalhos de um concílio iminente, não constitui acaso a rendição da independência espiritual da Igreja? Disto vem outra pergunta: a que ponto as decisões e os documentos de tal concílio, mesmo se devidamente promulgados pelo papa, vinculam os fiéis?”

Na mensagem de Fátima Nossa Senhora diz: “Virei pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz. Se não, espalhará os seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados. O santo padre terá muito que sofrer. Várias nações serão aniquiladas. Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará.” Ora, todos estes fatos mostram que os erros da Rússia condicionaram o concílio e, através deste, tiraram a liberdade da Igreja e desarmaram seus militantes. Será, portanto, sobre o espírito desse concílio que deverá triunfar Maria Virgem. [86]

Fonte: Texto retirado do livro "Entre Fátima e o Abismo - Considerações e Fatos Sobre o Segredo que Desafia o Pontificado e Assombra a Cristandade" - Araí Daniele, Página 84.
Foto: Retirada do site metaforas

30 de agosto de 2011

Do ódio santo de si mesmo




"Se se considera bem o que se há dito, bastará para engendrar em nós aquele ódio e aborrecimento santo de nós mesmos, que Cristo Nosso Redentor nos encomenda tanto no Sagrado Evangelho, que, sem ele, diz (Jo 14, 26), não podemos ser discípulos Seus. Por que, que mais é mister para isso, que saber que este nosso corpo é o maior opositor e inimigo que temos? Inimigo mortal, o maior traidor que jamais se viu, que anda buscando a morte, e morte eterna, a quem lhe dá de comer e tudo de que necessita; que por ter ele um pouco de prazer, não tem em nada ultrajar a Deus e jogar alma e corpo no inferno, para sempre.

Se dissessem a alguém: 'Sabei que um de vossa casa e dos que comem e bebem convosco, vos arma uma traição para matar-vos', que temor teria? E, se lhe dissessem: 'Pois sabei mais, que é tanto o ódio e inimizade que tem convosco, que tragada tem a morte em troca de matar-vos; já sabe que logo lhe hão de colher e matar a ele, e, com tudo isso, traz arriscada a vida para conseguir o que quer', como [o que fosse assim avisado] estando a comer e indo a dormir e a todas as horas, temeria e estaria sobressaltado, se havia de vir então [seu inimigo] e dar-lhe um golpe que o matasse! E, se pudesse descobrir quem é, que ódio lhe conceberia e que vingança faria contra ele! Pois esse nosso corpo, que come e dorme conosco, e sabe muito bem que fazendo mal a nossa alma, o faz também a si mesmo, e que jogando a alma no inferno, há de ir-se para lá com ela, com tudo isso, em troca de sair com seu gosto, atropela tudo e não repara em nada. Vede se temos razões de aborrecê-lo! Quantas vezes vos há posto no inferno esse vosso inimigo? Quantas vezes vos há feito ofender aquela Infinita Bondade? De quantos bens espirituais vos há privado? Quantas vezes põe vossa salvação em perigo a cada hora? Pois quem não se indignará e tomará uma coragem santa contra quem tantos males lhe há feito e de tantos bens lhe há privado e em tantos perigos lhe põe a cada momento? Se detestamos ao demônio e lhe temos por capital inimigo pela guerra e dano que que nos faz, maior inimigo é nossa carne, porque ela nos faz mais cruel e mais contínua guerra, e muito pouco poderiam os demônios, se não tivessem por eles esta carne e sensualidade para fazer-nos guerra com ela.

Isto fazia aos Santos ter este ódio e aborrecimento contra si mesmos; e daí nascia neles um espírito grande de mortificação e penitência para vingar-se de este seu inimigo, e trazê-lo sujeito e rendido, e andar sempre com temor de dar algum contento e conforto a seu corpo, parecendo-lhes que isso era ajudar e dar armas a seu inimigo, com que cobrasse bríos e forças para fazer-lhes mal. Diz Santo Agostinho: 'Não ajudemos nem demos forças a nossa carne, para que não faça guerra contra o espírito' (De salutaribus monitis, c. 35), mas procuremos castigá-la e mortificá-la para que não se rebele, porque, como diz o Sábio (Prov 29, 21), 'aquele que delicadamente cria a seu servo desde sua primeira idade, depois o achará rebelde e contumaz'.

Andavam aqueles santos monges antigos com tão grande cuidado neste exercício, procurando mortificar e diminuir as forças a este inimigo, que quando outros meios não bastavam, realizavam trabalhos corporais muito excessivos para domar e quebrantar seu corpo, como conta Paládio de um monje que era muito fatigado de pensamentos de vaidade e soberba, e não podendo afastá-los de si, resolveu tomar uma pá e passar um grande montão de terra de uma parte a outra. Perguntavam-lhe: 'Que fazeis?' Respondia: 'Atormento e fatigo a quem me fatiga e atormenta; vingo-me de meu inimigo'. O mesmo se diz de São Macário em sua Vida; e de São Doroteo se conta que fazia grande penitência e afligia muito a seu corpo, e, uma vez, vendo-lhe outro tão torturado, disse-lhe: 'Por que atormentas tanto teu corpo?' Respondeu: 'Porque me mata ele a mim'. O glorioso São Bernardo, encendido em um ódio e coragem santa contra seu corpo, como contra seu inimigo capital, dizia: 'Levante-se Deus em nossa ajuda, e seja destruido este inimigo, menosprezador de Deus, amador do mundo e de si mesmo, servo e escravo do demônio. Por certo, se tendes bom sentir, que digais comigo: Bem merece a morte! morra o traidor! coloquem-no no madeiro, crucifiquem-no!'

Pois com estes bríos e zelos temos de andar nós, mortificando nossa carne e sujeitando-a para que não se rebele, e arraste após si o espírito e a razão, e tanto mais que, vencido este inimigo, ficará também o demônio vencido. Assim como os demônios nos fazem guerra e nos procuram vencer por meio de nossa carne, assim nós havemos de fazer guerra aos demônios e vencê-los, mortificando-a e contradizendo-a. Nota isto muito bem Santo Agostinho sobre aquelas palavras do Apóstolo (I Cor 9, 20): 'Não luto eu contra o demônio como quem dá golpes no ar e briga com fantasmas, porque isso é inútil, senão que castigo e mortifico minha carne, e procuro trazê-la sujeita e rendida', diz o Santo: 'Pois castigai vossa carne, mortificai vossas paixões e más inclinações, e dessa maneira vencereis os demônios, porque dessa maneira nos ensina o Apóstolo a pelejar com eles'. Quando um capitão que está em fronteira de mouros vai ao rebate, põe na masmorra e deixa preso em ferros o mouro que tem cativo, porque não se levante contra ele e ajude aos inimigos; pois isso é o que nós havemos de fazer, sujeitando e mortificando nossa carne, para que não se faça do bando de nossos inimigos". 

Fonte: (Padre Alonso Rodríguez, S. J., Exercício de Perfeição e Virtudes Cristãs, parte 2, trat. I, cap. IV)
Foto: Generosamente cedida por Diego Ferracini ao P.H.C.O

29 de agosto de 2011

Onde não há ódio à heresia, não há santidade.



Se odiássemos o pecado como deveríamos odiá-lo; puramente, profundamente, valentemente, deveríamos fazer mais penitência, infligir em nós próprios maiores castigos, deveríamos chorar os nossos pecados mais abundantemente. Pois, então, a suprema deslealdade para com Deus é a heresia. É o pecado dos pecados, a mais repugnante das coisas que Deus desdenha neste mundo enfermo. No entanto, quão pouco entendemos da sua enorme odiosidade! É a poluição da verdade de Deus, o que é a pior de todas as impurezas.

Porém, quão pouca importância damos à heresia! Fitamo-la e permanecemos calmos. Tocâmo-la e não trememos. Misturamo-nos com ela e não temos medo. Vêmo-la tocar nas coisas sagradas e não temos nenhum sentido do sacrilégio. Inalamos o seu odor e não mostramos qualquer sinal de abominação ou de nojo. De entre nós, alguns simpatizam com ela e alguns até atenuam a sua culpa. Não amamos a Deus o suficiente para nos enraivecermos por causa da Sua glória. Não amamos os homens o suficiente para sermos caridosamente verdadeiros por causa das suas almas. 

Tendo perdido o tacto, o paladar, a visão e todos os sentidos das coisas celestiais, somos capazes de morar no meio desta praga odiosa, impertubavelmente tranquilos, reconciliados com a sua repulsividade, e não sem proferirmos declarações em que nos gabamos de uma admiração liberal, talvez até com uma demonstração solícita de simpatia tolerante [para com os seus promotores].

Porque estamos tão abaixo dos antigos santos, e até dos modernos apóstolos destes últimos tempos, na abundância das nossas conversões? Porque não temos a antiga firmeza! Falta-nos o velho espírito da Igreja, o velho génio eclesiástico. A nossa caridade não é sincera porque não é severa, e não é persuasiva porque não é sincera. 

Falta-nos a devoção à verdade enquanto verdade, enquanto verdade de Deus. O nosso zelo pelas almas é fraco porque não temos zelo pela honra de Deus. Agimos como se Deus ficasse lisonjeado pelas conversões, e não pelas almas trémulas, salvas por uma abundância de misericórdia. 

Dizemos aos homens a metade da verdade, a metade que melhor convém à nossa própria pusilanimidade e aos seus próprios preconceitos. E, então, admiramo-nos que tão poucos se convertam e que, desses tão poucos, tantos apostatem.

Somos tão fracos a ponto de nos surpreendermos que a nossa meia-verdade não tenha tanto sucesso como a verdade completa de Deus.

Onde não há ódio à heresia, não há santidade.

Um homem, que poderia ser um apóstolo, torna-se uma úlcera na Igreja por falta de recta indignação.

Fonte: Pe. Frederick William FABER [1814-1863], The Precious Blood, or: The Price of Our Salvation [O Preciosíssimo Sangue, ou: o Preço da Nossa Salvação], 1860, pp. 314-316.

Texto retirado do antigo blog odioaheresia

28 de agosto de 2011

A Atual Defesa da Fé – Uma Tarefa Ingrata


“A fé é um bem ainda maior do que a própria vida, porque nos livra da segunda morte” (São Tomás de Aquino)


Diante da Hierarquia: o leigo diante de seu pároco, o sacerdote diante de seu bispo, o bispo diante do Papa, os súditos, enfim, diante de seus prelados não só têm o dever e o direito de resistir aos mandados que vão contra a fé ou contra o bem das almas, o que não seria tão extraordinário na longa história da Igreja, mas têm hoje a ingratíssima tarefa de defender a autoridade contra a autoridade. O que foi sempre e principalmente objeto dos ataques do modernismo é o princípio de autoridade, e a paradoxal situação suscitada desde o Concílio consiste em que o ataque à autoridade da Igreja é agora levado a efeito com o peso dessa mesma autoridade. O erro mais funesto do magistério conciliar está justamente em ensinar que o magistério tradicional cometia erros, e seu mais perverso mandamento em dar ‘liberdade de desobediência’ aos mandamentos tradicionais da Igreja. O católico fiel deve discutir o magistério conciliar por docilidade ao magistério tradicional. É completamente coerente e justificado, porque o magistério tradicional ensinou com altíssima autoridade, dando garantia divina de sua verdade, enquanto o conciliar não oferece nenhuma garantia, pois dá liberdade de ‘dialogar’. Mas é um ofício difícil, porque a maioria dos cristãos considera a autoridade de maneira ‘material’ e opta por atitudes aparentemente mais simples: ou crê em todos os Papas e se torna esquizofrênica, ou não crê em nenhum e perde a fé, ou crê nos de antes porque eram Papas de verdade e consideram que agora a Sede está vacante.”

Negritos e Itálicos nossos.

Como o Senhor deixou certo em Mt, 10, 32-33, de que “Todo aquele, portanto, que me confessar diante dos homens eu o confessarei diante de meu Pai, que está nos céus. E o que me negar diante dos homens, também Eu o negarei diante de meu Pai, que está nos céus”, mais e mais, a confissão ou o testemunho em favor de Jesus diante dos homens vai prenunciando a realidade de algum martírio, de tal forma que chega a confirmar a sentença apocalíptica: “Porque o espírito profético não é outro que o testemunho de Jesus” (Ap, 19, 10b - parte final). E não será exatamente por este testemunho que o Senhor disse que “alguns dos últimos serão como os primeiros, assim como alguns primeiros estarão entre os últimos”?


Fonte: Texto retirado do livro "A Candeia Debaixo do Alqueire", Padre Álvaro Calderón, p.135, Edições Mosteiro da Santa Cruz, Angelicvm - Instituto Brasileiro de Filosofia e de Estudos Tomistas.
Credit of the photo: --Autor desconhecido

Deveres dos cristãos em defesa da fé



“A fé é o fundamento primeiro da unidade e existência mesma da Igreja, de maneira que, quando a fé está em perigo, todos os cristãos têm o grave dever de sair em sua defesa. Sendo esse um dever positivo, isto é, que não proíbe mas manda fazer algo, obriga segundo a condição das pessoas e a oportunidade. Como o Papa e os bispos diocesanos têm de Cristo o carisma da verdade para definir o dogma revelado, são eles os primeiros obrigados a defender a fé, discernindo com sua autoridade qual é a verdade católica em face das ameaças do erro. Mas os simples fiéis não são isentos de obrigação, porque, embora não lhes compita definir a doutrina, não lhes basta crer retamente em seu íntimo, senão que, para glória de Deus e utilidade do próximo, também são obrigados à profissão exterior e pública da fé: “Quando a fé está em perigo”, diz Santo Tomás, “todos são obrigados a propalar sua fé aos demais, quer para a instrução dos outros fiéis, quer para confirmá-los nela ou para reprimir o ultraje dos infiéis”. (Suma Teológica II-II, q. 3, a.2, ad 2).
Pois bem, ainda que o modo e o grau de obrigação da Hierarquia e dos simples fiéis sejam diversos, como porém a fé é um bem comum fundamental na Igreja, em ordem à defesa da fé há certa igualdade entre todos os cristãos. Portanto, se a Hierarquia mostra defecção em sua obrigação, os súditos têm o dever e o direito de argüir e repreender seus pastores como que de igual para igual, privadamente se o escândalo for oculto, publicamente se for público: “Quando ‘se resiste de frente e à vista de todos’ (São Paulo aos Gálatas, II, 11-14), ultrapassam-se os limites da correção fraterna; e por isso São Paulo não teria repreendido daquele modo São Pedro se não fosse de algum modo seu igual quanto à defesa da fé. Mas admoestar secreta e reverentemente também o pode fazer aquele que não é igual a outro, razão por que o Apóstolo escreve com respeito aos súditos que admoestem seu prelado, quando diz: “Dizei ao Bispo Arquipo: cumpre teu ministério” (Col., IV, 17). Deve-se saber, não obstante, que onde houver perigo para a fé os prelados podem ser repreendidos mesmo publicamente pelos súditos. Razão por que São Paulo, que era inferior a São Pedro, por causa de um iminente perigo de escândalo com relação à fé, repreende-o publicamente” (Santo Tomás, Suma Teológica, II-II, q. 33, a.4, ad 2.


Será que pela atual e moderna defecção da Hierarquia é que se lê em Ap, 18, 23a: “Não brilhará mais em ti a luz de lâmpada, não se ouvirá mais em ti a voz do esposo e da esposa”?
Negritos e Itálicos nossos. 

Fonte: Texto retirado do livro "A Candeia Debaixo do Alqueire", Padre Álvaro Calderón, p.132-133, Edições Mosteiro da Santa Cruz, Angelicvm - Instituto Brasileiro de Filosofia e de Estudos Tomistas.
Credit of the photo: --By Saints.SQPN.com

27 de agosto de 2011

O leigos tem o direito e o dever de se protegerem de Prelados que se desviaram da fé

 

O exemplo de S. João Gualberto

 

        Porém, é um Santo da Igreja Católica que nos indica o exemplo a seguir quando os Fiéis são confrontados com um Prelado rebelde que traz males à Igreja5

        S. João Gualberto viveu no século XII. Não é apenas um Santo; é também o fundador dos Beneditinos Valambrosianos. A sua festa celebra-se a 12 de Julho no calendário antigo. A heroicidade da virtude cristã de S. João Gualberto fica demonstrada por ele ter perdoado o assassino de seu irmão: encontrando-o um dia sem armas e sem defesa num beco sem saída, S. João Gualberto (que ainda nem sequer era monge) sentiu-se movido ao perdão quando o outro, erguendo para ele os braços em forma de cruz, lhe pediu misericórdia por amor de Cristo crucificado. E S. João perdoou àquele homem, apesar de ter andado em sua busca com um bando de soldados, a fim de executar vingança. Era Sexta-Feira Santa - foi então que S. João Gualberto viu uma imagem de Cristo crucificado que, tomando vida, lhe fazia com a cabeça um sinal de assentimento. Nosso Senhor transmitiu nesse momento a S. João uma extraordinária Graça especial que o levou a perdoar ao assassino de seu irmão. Foi também esse momento de Graça que o levou a tornar-se monge. 

        Como vemos, S. João Gualberto é o exemplo acabado do perdão de Cristo: quem pode perdoar o assassino do seu irmão pode perdoar qualquer ofensa. Ele foi ainda um homem de considerável importância na Hierarquia da Igreja, tendo conseguido fundar um Mosteiro e uma Ordem de monges que ainda existe nos nossos dias. A Ordem tinha - e ainda tem - a seu cargo uma igreja em Roma, a Igreja de Santa Praxedes, onde foi descoberta nada mais nada menos do que a coluna a que ataram Cristo para ser açoitado. É nesta igreja, mesmo ao virar a esquina da Igreja de Santa Maria Maior, que se encontra uma pintura do Santo perdoando ao assassino de seu irmão - evento claramente muito importante na História da Igreja. 

        No entanto, para além da sua exemplar misericórdia cristã e da sua relevante estatura na Igreja, S. João Gualberto não hesitou em procurar obter o afastamento de um Prelado corrupto do seu tempo: foi a Latrão (residência do Papa, quando ainda não se tinha criado o enclave do Vaticano) pedir que o Arcebispo de Florença fosse afastado, por ser indigno do seu cargo. O fundamento para o pedido de S. João era ter o Arcebispo subornado com dinheiro certas pessoas influentes, de modo a ser ele designado Arcebispo - isto é, ele comprara o seu cargo eclesiástico, o que constitui um grave pecado de simonia. 

        Ora, não tendo os funcionários do Papa em Latrão - inclusive S. Pedro Damião - feito nada para afastar esse Arcebispo, invocando uma suposta falta de provas, S. João recebeu de Deus uma especial inspiração: como prova de que S. João dizia a verdade sobre o Arcebispo, Deus havia de dar um sinal. Um dos seus frades, o Irmão Pedro, caminharia pelo meio de uma fogueira de onde emergiria miraculosamente sem qualquer queimadura, em testemunho de que era verdadeira a acusação de S. João Gualberto contra o Arcebispo. Então o Santo chamou todo o povo da cidade dizendo-lhes que fizessem uma enorme fogueira com uma estreita passagem pelo meio; e explicou-lhes qual a razão de tudo aquilo e o que iria acontecer. Então o Irmão Pedro, sob santa obediência, passou pela estreita passagem ardente e saiu, são e salvo, pelo outro lado; devido à sua grande Fé foi o Irmão Pedro beatificado (celebrando-se a sua festa a 8 de Fevereiro no Martirológio Romano). Quando os fiéis - leigos - viram este sinal milagroso, ergueram-se todos à uma e expulsaram de Florença o Arcebispo: este teve de pôr a sua vida a salvo; e o Papa teve de designar um digno substituto. 

(...)

 Conclusão:

   O que é que este acontecimento da História da Igreja nos diz sobre a nossa actual situação? Mostra-nos que os leigos têm o direito e o dever de se protegerem de Prelados que, transviados, estão a causar males à Igreja e às almas devido ao seu comportamento desviante. Neste tempo sem paralelo de crise na Igreja, dificilmente estaremos sozinhos na busca - episódica - deste remédio que o Papa nos pode dar.  



Fonte: Texto retirado do livro "O Derradeiro Combate do Demônio", Cap. 16
Credit of the photo: --By Wikipedia

24 de agosto de 2011

Heteropraxis vs Orthopraxis

Na foto: Um padre distribuindo a Sagrada Eucaristia como se fosse um biscoito.


O ataque inclui tanto a má prática
como a má doutrina
 
       Devemos aqui fazer notar que não é apenas por sustentar ou não sustentar a Fé verbalmente que se determina se um membro do Clero (ou do laicado) é bom ou nocivo. Para além da comparação do seu ensino - ou seja: das palavras de um Sacerdote, de um Bispo, de um Cardeal ou do Papa - com o ensino infalível do Magistério, é preciso ver se essa pessoa também professa a prática ortodoxa da Igreja Católica, quer pelas suas palavras (escritas e faladas) quer pelas suas acções e pela conduta cristã da sua vida. É preciso saber se acaso essa pessoa (Sacerdote, Bispo, Cardeal ou Papa) adere a alguma(s) heteropraxis - práticas contrárias à Fé -, tal como o desrespeito para com o Santíssimo Sacramento. 

       Ora a Fé pode ser atacada por acções, quer realizadas de uma maneira óbvia quer subtil. E as nossas acções têm de confirmar as nossas palavras. Assim, nós sustentamos a Fé se formos fiéis às doutrinas nos nossos pensamentos, palavras e escritos; e também se mantivermos as práticas piedosas da Igreja que alimentam a nossa Fé. Mas, se introduzirmos na nossa Paróquia (ou na Diocese ou Província eclesiástica local, ou mesmo na Igreja Universal, como alguns Doutores Católicos escreveram que poderia acontecer) práticas heterodoxas que dão a impressão de que a Fé definida não é digna de crédito, escandalizar-se-ão “os pequeninos” e até algumas almas eruditas, devido a essa(s) heteropraxis

       Por exemplo: sabemos pelas definições solenes do Concílio de Trento que Deus nos dá a certeza de que a Hóstia Consagrada é verdadeiramente a Presença Real de Nosso Senhor Jesus Cristo - isto é, o Seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Ora os Protestantes rebeldes quiseram negar este artigo da Fé e, ainda, influenciar outros para que fizessem o mesmo. Foi assim que a prática da Comunhão na mão - inicialmente introduzida, como prática muito alargada, pelos hereges arianos do Século IV, em sinal da negação de que Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus - foi re-introduzida. Por esta acção simbólica, a sua negação seria clara aos olhos de todos. 

       Nos nossos dias, os inimigos da Igreja têm usado da heteropraxis para escandalizar muitos Católicos e para lhes fazerem perder a Fé na Presença Real de Jesus Cristo [na Eucaristia]. Por essa razão é que a lei universal da Igreja proibiu a Comunhão na mão, como sendo um abuso, ao longo de muitos séculos - e continua ainda a proibi-la até hoje. O indulto recente [ou seja: a autorização] para ir contra a letra da lei é apenas permitido se esta prática não conduzir à diminuição da Fé na Presença Real, e se não conduzir a um menor respeito para com essa Presença Real de Cristo. Todavia, o resultado é sempre esse, como podemos ver pela nossa experiência diária com esta forma de heteropraxis20

       Por outro lado, às práticas que sustentam a doutrina ortodoxa da Igreja dá-se o nome de orthopraxis (isto é, práticas católicas ortodoxas) e incluem: genuflexão na presença do Santíssimo Sacramento, dar/receber a Comunhão na boca, conservar o tabernáculo com o Santíssimo Sacramento como o principal foco de atenção (e de adoração) e como o centro do santuário; o comportamento solene do Clero no interior do santuário, mostrando a devida reverência para com a Presença de Deus no Santíssimo Sacramento. Estes exemplos de orthopraxis (acções ortodoxas que mantêm a Fé) testemunham a verdade do dogma de que o Santíssimo Sacramento é a Presença Real de Deus - Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, sob a aparência de pão - bem como o devido respeito do Homem para com Deus. 

       Exemplos de heteropraxis contra o dogma da Presença Real incluem (como já vimos) a Comunhão na mão. Esta forma de heteropraxis veicula aos Fiéis a mensagem errónea de que o Santíssimo Sacramento não é assim tão importante, visto que Ele é só pão, e promove a heresia de que Ele não é a Presença Real de Deus - Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo sob a aparência de pão. Outro exemplo de heteropraxis nesta área é afastar constantemente do santuário o tabernáculo com o Santíssimo Sacramento - colocando-O numa sala ao lado, ou então numa espécie de “armário de vassouras”, de modo que o foco principal de atenção (e de adoração) no santuário passa a ser a cadeira do “celebrante” ou “Presidente da assembleia”. A mensagem, subtilmente dada e recebida, é a de que a pessoa que se senta na cadeira é mais importante que o Santíssimo Sacramento. E uma vez que o “Presidente da assembleia” representa o povo, é subtilmente dada a mensagem de que Deus é menos importante do que o povo. 

       Estes exemplos fazem-nos lembrar de novo as palavras do Papa Pio XII, citadas mais acima:
       Suponha, caro amigo, que o Comunismo [um dos “erros da Rússia” mencionados na Mensagem de Fátima] foi somente o mais visível dos instrumentos de subversão usados contra a Igreja e contra as tradições da Revelação Divina (...) As mensagens da Santíssima Virgem a Lúcia de Fátima preocupam-me. Esta persistência de Maria sobre os perigos que ameaçam a Igreja é um aviso do Céu contra o suicídio de alterar a Fé na Sua liturgia, na Sua teologia e na Sua alma . (…) Chegará um dia em que o Mundo civilizado negará o seu Deus, em que a Igreja duvidará como Pedro duvidou. Ela será tentada a acreditar que o homem se tornou Deus (…) Nas nossas igrejas, os Cristãos procurarão em vão a lamparina vermelha onde Deus os espera. Como Maria Madalena, chorando perante o túmulo vazio, perguntarão: “Para onde O levaram?”21
       Das palavras do Papa Pio XII parece intuir-se que as formas de heteropraxis (acima mencionadas) contra o Santíssimo Sacramento eram explicitamente mencionadas no Terceiro Segredo de Fátima - porque, se é certo que o Papa Pio XII as relaciona com a Mensagem de Fátima, elas não são mencionadas em parte alguma da Mensagem que já foi publicada. Logo, têm de ser mencionadas no Terceiro Segredo - ou seja, na parte ainda não publicada. O Papa Pio XII diz claramente que é Nossa Senhora de Fátima Quem nos avisa contra «o suicídio de alterar a Fé na Sua liturgia, na Sua teologia e na Sua alma». Portanto, o Terceiro Segredo avisa-nos, tanto em relação à falsa doutrina como à heteropraxis, como sendo ataques contra «o dogma da Fé». 


Credit of the photo: --By Francis Phillips
Fonte: Texto retirado do livro "O Derradeiro Combate do Demônio", Cap. 13

4 de agosto de 2011

Livro "O Derradeiro Combate do Demônio"

 
O aparecimento da “Linha do Partido” sobre Fátima
 
     Mas os Fiéis não abandonariam facilmente a Consagração da Rússia, porque era óbvio que, durante o período 1984-2000, a Rússia não experienciara a Conversão religiosa que a Virgem tinha prometido, como fruto de uma adequada Consagração ao Imaculado Coração de Maria. Muito pelo contrário: apesar de certas mudanças políticas, a condição material, moral e espiritual da Rússia apenas piorou desde a dita “consagração” de 1984. 
     Repare-se nestas provas, que fornecem apenas um esboço da gravidade da situação da Rússia pelo ano 2000 (e que só tem vindo a piorar desde então, como veremos):
  • Uns 16 anos depois da Consagração, a Rússia tem a taxa mais alta de abortos no Mundo inteiro. O Padre Daniel Maurer, CJD, que passou os últimos oito anos na Rússia, diz que, estatisticamente, a mulher russa terá em média oito abortos durante os seus anos férteis - embora o Padre Maurer creia que o número real andará à volta de 12 abortos por cada mulher; ele falou mesmo com mulheres que chegaram a fazer 25 abortos. A principal razão para números tão arrepiantes é que outros métodos de contracepção (que são imorais, de qualquer modo) nem foram difundidos na Rússia, nem são de confiança. Isto deixa o aborto como «o meio mais barato para limitar o tamanho da família». Actualmente na Rússia os abortos são gratuitos; mas os nascimentos não o são7.
  • A taxa de natalidade russa está a baixar, e a população da Rússia está a diminuir ao ritmo de 700.000 pessoas por ano - acontecimento sem precedentes numa nação civilizada durante «uma época de paz»8.
  • A Rússia tem o consumo de álcool mais alto do Mundo9.
  • O satanismo, o ocultismo e a feitiçaria estão em ascensão na Rússia, como até Alexy II, o Patriarca Ortodoxo Russo, admite publicamente10.
  • A homossexualidade está à rédea solta, quer em Moscovo quer por toda a parte do país. Com efeito, em Abril de 1993, nove anos depois da “consagração” de 1984, Boris Yeltsin permitiu que a homossexualidade fosse despenalizada. A homossexualidade é agora “legal” na Rússia11.
  • A Rússia é um centro mundial de eleição para a difusão de pornografia infantil. A Associated Press apresentou um relatório sobre uma rede de pornografia infantil, com sede em Moscovo e ligada a uma outra rede de pornografia infantil no Texas. Citando AP: «A lei russa não distingue entre pornografia infantil e pornografia que envolva adultos, e trata a produção e difusão de ambos como um crime menor - disse Dmitry Chepchugov, chefe do departamento do Ministério do Interior Russo para os crimes de alta tecnologia. A polícia russa frequentemente se queixa do caos legal que fez da Rússia um centro internacional de produção de pornografia infantil. “Infelizmente, a Rússia transformou-se num contentor de lixo mundial de pornografia infantil ” - disse Chepchugov aos jornalistas em Moscovo»12.
  • Agora os Russos vêem avidamente os programas de televisão “da vida real”. Nos shows “da vida real” mais depravados, câmaras de vídeo filmam a vida pessoal íntima de ‘casais’ russos, incluindo a sua actividade sexual. Apesar dos murmúrios de desaprovação de velhos Comunistas, partidários de uma linha dura, os telespectadores russos “nunca se fartam” desta pornografia. O programa «gaba-se de uma taxa de audiências de mais de 50%, e milhares de Russos aguentam temperaturas abaixo de zero e esperam, em fila, durante mais de uma hora, só para espreitarem [essa ‘vida real’] através duma janela do apartamento. Milhões já visitaram esse site da Internet - que bloqueia frequentemente sob o peso do tráfego»13.
  • Quanto à situação da Igreja Católica: em 1997, a Rússia decretou uma lei nova sobre “liberdade de consciência” que deu um estatuto privilegiado à Ortodoxia Russa, ao Islamismo, Judaísmo e Budismo, que foram consideradas “as religiões tradicionais” da Rússia; por seu turno, era necessário às paróquias católicas obterem a aprovação dos burocratas locais, só para terem o direito de existir. Como resultado:
  • O minúsculo Sacerdócio católico na Rússia, uns 200 Sacerdotes, é formado quase inteiramente por Clerigos nascidos no estrangeiro, sendo, a muitos deles, concedidos vistos de entrada no país com um prazo apenas de três meses - enquanto os homens de negócios recebem vistos de entrada de seis meses14.
  • Há apenas dez Sacerdotes nascidos na Rússia em todo o país - cinco na Sibéria e cinco no Cazaquistão -, tendo 95% dos Sacerdotes e Freiras nascido no estrangeiro. Na opinião franca do Senhor Arcebispo Bukovsky, a Igreja Católica «é pequena (…) e será sempre pequena»15.
  • Os Católicos constituem menos de metade de 1% da população russa, enquanto os Muçulmanos russos ultrapassam 10 vezes mais o número de Católicos. Segundo notícia da Rádio Free Europe, o Catolicismo é visto, na Rússia, como «um tipo de esquisitice inexplicável - qual a razão por que um Russo haveria de ser católico?»16.
  • Segundo o Vaticano, há 500.000 Católicos na Rússia, a maioria dos quais estão na Sibéria - para onde Stálin enviara os seus avós17
     Dado este tipo de evidências, não era possível - pura e simplesmente - que se desvanecesse facilmente a interrogação sobre se a Consagração da Rússia teria sido feita do modo pedido por Nossa Senhora de Fátima ou não. Portanto, na perspectiva dos executores da nova orientação da Igreja - a Adaptação da Igreja ao Mundo -, algo tinha que ser feito com respeito a Fátima. E, em especial, algo tinha que ser feito com respeito a um Sacerdote canadiano, de nome Padre Nicholas Gruner, cujo apostolado de Fátima se tinha tornado uma voz de peso para milhões de Católicos que estavam convictos de que a Consagração da Rússia ‘descarrilara’ devido aos planos de certas personagens do Vaticano. Era tão simples quanto isto: Fátima e “o Sacerdote de Fátima” tinham que ser enterrados de uma vez por todas. 
     O processo começou já há muito, em 1988, no momento em que - conta Frère François - «uma ordem veio do Vaticano dirigida às autoridades de Fátima, à Irmã Lúcia, a diversos eclesiásticos incluindo o Padre Messias Coelho e um sacerdote francês [evidentemente, o Padre Pierre Caillon] muito devoto de Nossa Senhora, ordenando a todos que deixassem de importunar o Santo Padre com o assunto da Consagração da Rússia». O Padre Caillon, devoto de Fátima, confirmou a emissão desta ordem: «uma ordem veio de Roma, que obrigava todos a dizerem e a pensarem: “A Consagração está feita. Tendo o Papa realizado tudo o que está ao Seu alcance, dignou-se o Céu aceitar este gesto”»18. Foi por esta altura (1988-1989) que muitos Apostolados de Fátima - que tinham persistido em que a Consagração da Rússia ainda não fora feita - inverteram inesperadamente as suas posições e declararam que a Consagração de 1984 tinha cumprido os desejos do Céu. Lamentavelmente, até mesmo o Padre Caillon logo a seguir mudou o seu testemunho e começou a dizer que a Consagração de 1984 tinha cumprido os pedidos da Santíssima Virgem. 
     Foi também por essa época que começaram a circular cartas, alegadamente da Irmã Lúcia, escritas à maquina e geradas por computador. Destas cartas - manifestamente incríveis - ficou típica a de 8 de Novembro de 1989, dirigida ao Senhor Noelker e que contém a afirmação da “Irmã Lúcia” de que o Papa Paulo VI consagrou o Mundo ao Imaculado Coração de Maria durante a sua breve visita a Fátima em 1967 - uma Consagração que nunca aconteceu, como a Irmã Lúcia decerto sabia, porque testemunhou pessoalmente a visita inteira19
     Deste modo emergiu a Linha do Partido na Mensagem de Fátima. A que chamamos, exactamente, “a Linha do Partido”? Vladimir Ilyich Lénin disse certa vez: «A mentira é sagrada e o engano será a nossa principal arma.» Portanto, não era surpresa nenhuma que o Pravda, na qualidade de órgão oficial do Partido Comunista Soviético, estivesse cheio de mentiras - embora a palavra russa Pravda signifique “verdade”. Então, um jornal chamado “Verdade” estava sempre cheio de mentiras: porque, como dizia Lénin, «A mentira é sagrada e o engano será a nossa principal arma.» 
     Ora um mentiroso não convencerá ninguém com as suas mentiras, se usar ao peito um grande cartaz a dizer “Mentiroso!”. Nem sequer um palerma acreditaria em tal homem. Para o mentiroso convencer as pessoas de que as suas mentiras são verdade, então a verdade tem que ser redefinida. É isto mesmo o que quer dizer a frase de Lénin «a mentira é sagrada (…)». A mentira torna-se “verdade” e é-lhe servilmente dada adesão, em vez da verdade. Como dizem as Sagradas Escrituras ao pronunciarem a maldição no livro de Isaías: «Ai daqueles que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que mudam as trevas em luz e a luz em trevas.» (Is. 5:20). Às trevas da falsidade é dada a aparência da luz da verdade - e é este um dos erros fundamentais da Rússia. 
     Mas este truque de transformar uma mentira em “verdade” não tem a sua origem na Rússia nem nos Comunistas; a sua origem é o demónio, que é o Pai das Mentiras. São Paulo fala do demónio sob a aparência de um anjo de luz. Para ser mais específico, ele está a referir-se ao Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo: «Mas ainda que alguém - nós mesmos ou um anjo do Céu - vos anuncie outro Evangelho além do que aquele que vos tenho anunciado, esse seja anátema.» (Gal. 1:8). É o demónio, aparecendo sob o aspecto de um anjo de luz, que dá a aparência da verdade, de modo a enganar por meio da mentira. E foi daqui que o erro - “a mentira é sagrada” e “a falsidade é a verdade” - se originou. 
     O Padre Paul Kramer relata uma conversa que teve com o General Daniel Graham, do Exército dos E.U.A. «O General Graham disse que uma vez esteve na Rússia com um oficial soviético e que esse oficial soviético lhe perguntou: “O Senhor não deseja a paz?” E o General respondeu: “Não! Porque eu conheço a vossa definição de paz. Não quero esse género de paz.” Enquanto conversavam, passaram por um cartaz gigante que mostrava soldados armados de espingardas. No cartaz havia a legenda: “Pobieda kommunista eta mir.” Que em português é: “A vitória comunista é a Paz.”» 
     Segundo o ensino marxista, o Estado comunista faz a guerra para fomentar a revolução e emprega todos os meios possíveis de engano - guerra total - de modo a subjugar o Mundo inteiro ao Comunismo. Uma vez que a guerra total se tenha efectuado e que o Comunismo seja vitorioso sobre todo o planeta, haverá então a versão comunista de “paz”. Mas, na realidade, o que é a Paz? A Paz é definida com mais precisão por Santo Agostinho: «A Paz é a tranquilidade da ordem». Qual é a definição correcta? Não se trata de um assunto de avaliação subjectiva. São Tomás de Aquino explica: «ens et verum convertunter», que é uma maneira erudita de dizer que a verdade é convertível com a realidade - ou seja, aquilo que é objectivamente real é, por essa mesma razão, objectivamente verdadeiro. Por outras palavras: a verdade é aquilo que é, enquanto uma mentira é aquilo que não é. Aquilo que não é não pode ser verdade. Logo, se alguém diz, por exemplo, que o branco é preto, tal afirmação é uma mentira - por mais alta que seja a autoridade daquele que faz a afirmação. 
     Segundo a doutrina marxista, todavia, a verdade é aquilo que promove a revolução comunista. E o que é que promove a revolução comunista? Tudo o que tiver sido decidido constituir a Linha do Partido: aquilo que o Partido dita para ser verdadeiro passa a ser a verdade”, mesmo se, efectivamente, for uma mentira. Deste modo, se a Linha do Partido afirma “que o preto é branco”, é nisso, portanto, que todos os membros do Partido têm de acreditar - simplesmente porque assim foi decidido pelo Partido: “que o preto é branco”. 
     Ora, tal como houve uma espécie de “Estalinização” da Igreja, no sentido de uma Adaptação da Igreja ao Mundo, assim também há-de haver uma espécie de Linha do Partido estalinista sobre Fátima: uma versão da Mensagem de Fátima ditada pelas cúpulas e à qual todos os membros da Igreja da Adaptação pós-conciliar têm de aderir. Essencialmente, a Linha do Partido sobre Fátima resume-se a isto: A “Consagração da Rússia” foi levada a cabo por completo, pelo que todos devem deixar de pedir que ela se faça. Temos “a paz”, tal como foi vaticinado por Nossa Senhora de Fátima. A Rússia está a realizar a “conversão” que Nossa Senhora prometeu. Logo - segundo a Linha do Partido - nada na Mensagem de Fátima ficou por fazer: e Fátima pertence agora ao passado. 
     Como veremos, todos os termos entre vírgulas altas - “consagração da Rússia”, “paz” e “conversão” - foram redefinidos, para a Linha do Partido se acomodar a Fátima. Portanto, em tudo o que diga respeito a Fátima, é-nos agora pedido que acreditemos o equivalente a “o que é preto é branco” - porque é essa a Linha do Partido.