Questão ao amor incondicional
Santo Tomás provou que Deus é ato puro e que nunca está ou atua em potência, ou seja, Deus faz só aquilo que Ele É, como tinha dito a Moisés: “Eu sou Aquele que É”. Como tão bem leciona o Silveira, que eu nunca poderia querer eu explicar melhor do que ele.
Assim, vou me reduzir a este ponto para dizer que nem se Deus quisesse ser injusto poderia sê-lo ou cometer uma injustiça. Neste ponto é que deve ser considerada a misericórdia: não pode haver misericórdia sem justiça. Imploremos por ela e ela nos será dada também se a quisermos de fato, mas nunca sem justiça no próprio ato e no seu desdobramento.
Digo tudo isso, porque, uma vez sorvendo bastante atrasado a Tradição, ouço sempre uma intervenção moderna de que “não acho que Deus será tão duro” ou de que “acho que Deus perdoará ao final e não castigará” e, uma pior ainda, de que “vocês da Tradição vivem do ódio”.
Sim, o pensamento moderno, resumindo tudo, acredita que nossa conceituação, daqueles que querem aplicar a Tradição para si e para os seus, não passa de uma esquematização do ódio.
Ora, voltando à primeira sentença de Santo Tomás e trazendo à baila lições mais populares de Santo Afonso Maria de Ligório, quando, por exemplo, este ensinou sobre o juízo particular e sobre o purgatório, explicando a intensidade como a alma sente e vislumbra sem o corpo, na outra vida não cabe nenhum “acho”, porque tudo o tempo todo é o que é de modo total e para todos. Explico, repetindo com minhas palavras o ensinamento de Santo Tomás, assim como os anjos ao abordarem um objeto ou uma vivência em um só ato captam seu inteiro teor, assim também procede a alma desprendida do corpo, ainda que não no nível da inteligência dos anjos, mas indubitavelmente, sem possibilidade de engano ou de dispersão desde si mesma.
Então, como adstrito à Verdade, se para nosso juízo dirigido à condição vindoura de infinitamente determinado, porque desde já diante da Verdade, uma vez bastante revelada aos homens na terra, um “acho” ou um “achismo” será sempre partir-se do erro ou errar de início para se complicar mais e mais em decorrência. E eu sei que é certo de que para uma nova implicação, enquanto esta possa ser abstraída pelo fato de que sobre esta nada pese do império de que “Roma locuta causa finita”, é a mim permitida uma opinião ou um “acho” até que Roma venha ditar a Verdade como devido por cunho bimilenar desde a delegação de Cristo apenas aos apóstolos de que “quem vos ouve a Mim ouve”, mas se acho como os modernos, abarcando todo o conceito com sua respectiva valoração que tente sustentá-lo apenas por querer fazer de minha opinião igualitária em autoridade ao magistério, erro hereticamente de início como me condeno também de início por não crer, pois “aquele que não crê já está julgado e condenado”, de vez que, se obedeço ao magistério, sempre dele devo partir até para lhe apresentar novas questões e não inventar como o diabo à Eva.
Então, não cabe a homem algum dizer como acha que Deus fará algo, muito menos a partir de nossa parca condição em si, abstraindo-a da graça, de uma apreensão tão limitada. Podemos, sim, com certeza, dizer que Deus fará tanto como Ele É. E como Deus “não pode enganar e nem Se enganar”, fará sempre com inteiras justiça, lealdade e fidelidade. Como, aliás, nos lembra o salmo, de que “o trono de Deus está assentado sobre a justiça e o direito”, sem os quais, diga-se de passagem, nenhum fundamento pode manter-se sem abalo.
Tudo isso como introdução, chego ao ponto do amor incondicional. Estudando a moral numa moderna escola de teologia, o professor iniciou o curso advertindo: “antes do concílio valia a lei, agora, vale a pessoa”. E eu me assustei! Posteriormente, quanto mais lia sobre a moral nos autores modernos, mais e mais vinha a referência ao amor incondicional de Deus pelo homem. Mas como pode ser este início de abordagem que direciona tudo pró homem a partir de um amor incondicional a ponto de anular toda a pedagogia divina? Mais e mais parecia ouvir o homem responder de que se é amado incondicionalmente, então, deveria ter ou tem o direito de dizer como deve ou como quer ser amado. E, aí, a inversão se torna completa ou ilimitada.
No entanto, na outra extremidade, vinham-me flashes das escrituras tais como aquele da promessa feita a Davi sob a condição de que se seus filhos não traíssem a aliança para que sua posteridade nunca deixasse o trono. E muitas outras como “hei de salvá-lo porque confiou em Mim”, que pode ser traduzido como “salvar-lhe-ei se confiar em Mim”. Qual amor incondicional é este e como se dá? Como disse Chesterton de que abandonou Maquiavel no seu leito de morte, Deus não abandonou reis, juízes e sacerdotes por sua infidelidade aos votos ou deveres a ponto de lhes impor a pena de morte? O tempo da caridade teria a virtude ou o vício de anular a lei?
A doutrina moderna despreza toda a pedagogia de Deus. Aliás, nega a correção divina como a de um carrasco inventado por rudes para criar um deus irreconhecível conivente com o relativismo. Recorri, muito mais tarde, ao endereço certeiro da Tradição e notei que o amor incondicional de Deus é a princípio e em vista do fim (da salvação), mas nunca com dispensa de sua justa e rigorosa pedagogia no meio, ao contrário da crença moderna que substitui totalmente a justiça por uma misericórdia desviada de seu propósito ou fim de justiça pela justificação divina na cruz com Sua exclusiva inocência, contudo, sem revogar a prova para justificar os homens.
A isso incentivaram e disso se beneficiaram, como por enxertos rasteiros em árvore destinada a frutos delicados e já designada como nova igreja, tanto o marxismo como o iluminismo, na modulação do liberalismo católico, a ponto das infiltrações merecerem de Nossa Senhora em Salete a sentença de que o diabo cegou a inteligência de seus adeptos por suas paixões, pois, na verdade, toda a rebeldia do marxismo e do iluminismo não conseguiu esconder sua fonte na soberba da carne ávida por prazer sem limite, para tanto, tendo buscado servir-se do poder do dinheiro e resumindo, assim, seu ódio por Jesus, que mais e mais vem sendo exteriorizado até por nossos governantes, uma vez que Adão, quanto à carne, guardou no efeito a causa de sua reprovação e nos deu sua marca que é a soberba que seduz como escraviza.
Ou não nos disseram que, quando nossos pais queriam ser tradicionais, estariam querendo castrar-nos e de que Deus não pune o amor, quando queriam insinuar amor como sexo, o que agora não mais escondem?
Reflita a respeito.
Minus
Fonte: Texto enviado por um leitor
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Ave Cor Mariae!