O aparecimento da “Linha do Partido” sobre Fátima
Mas os Fiéis não abandonariam facilmente a Consagração da Rússia, porque era óbvio que, durante o período 1984-2000, a Rússia não experienciara a Conversão religiosa que a Virgem tinha prometido, como fruto de uma adequada Consagração ao Imaculado Coração de Maria. Muito pelo contrário: apesar de certas mudanças políticas, a condição material, moral e espiritual da Rússia apenas piorou desde a dita “consagração” de 1984.
Repare-se nestas provas, que fornecem apenas um esboço da gravidade da situação da Rússia pelo ano 2000 (e que só tem vindo a piorar desde então, como veremos):
- Uns 16 anos depois da Consagração, a Rússia tem a taxa mais alta de abortos no Mundo inteiro. O Padre Daniel Maurer, CJD, que passou os últimos oito anos na Rússia, diz que, estatisticamente, a mulher russa terá em média oito abortos durante os seus anos férteis - embora o Padre Maurer creia que o número real andará à volta de 12 abortos por cada mulher; ele falou mesmo com mulheres que chegaram a fazer 25 abortos. A principal razão para números tão arrepiantes é que outros métodos de contracepção (que são imorais, de qualquer modo) nem foram difundidos na Rússia, nem são de confiança. Isto deixa o aborto como «o meio mais barato para limitar o tamanho da família». Actualmente na Rússia os abortos são gratuitos; mas os nascimentos não o são7.
- A taxa de natalidade russa está a baixar, e a população da Rússia está a diminuir ao ritmo de 700.000 pessoas por ano - acontecimento sem precedentes numa nação civilizada durante «uma época de paz»8.
- A Rússia tem o consumo de álcool mais alto do Mundo9.
- O satanismo, o ocultismo e a feitiçaria estão em ascensão na Rússia, como até Alexy II, o Patriarca Ortodoxo Russo, admite publicamente10.
- A homossexualidade está à rédea solta, quer em Moscovo quer por toda a parte do país. Com efeito, em Abril de 1993, nove anos depois da “consagração” de 1984, Boris Yeltsin permitiu que a homossexualidade fosse despenalizada. A homossexualidade é agora “legal” na Rússia11.
- A Rússia é um centro mundial de eleição para a difusão de pornografia infantil. A Associated Press apresentou um relatório sobre uma rede de pornografia infantil, com sede em Moscovo e ligada a uma outra rede de pornografia infantil no Texas. Citando AP: «A lei russa não distingue entre pornografia infantil e pornografia que envolva adultos, e trata a produção e difusão de ambos como um crime menor - disse Dmitry Chepchugov, chefe do departamento do Ministério do Interior Russo para os crimes de alta tecnologia. A polícia russa frequentemente se queixa do caos legal que fez da Rússia um centro internacional de produção de pornografia infantil. “Infelizmente, a Rússia transformou-se num contentor de lixo mundial de pornografia infantil ” - disse Chepchugov aos jornalistas em Moscovo»12.
- Agora os Russos vêem avidamente os programas de televisão “da vida real”. Nos shows “da vida real” mais depravados, câmaras de vídeo filmam a vida pessoal íntima de ‘casais’ russos, incluindo a sua actividade sexual. Apesar dos murmúrios de desaprovação de velhos Comunistas, partidários de uma linha dura, os telespectadores russos “nunca se fartam” desta pornografia. O programa «gaba-se de uma taxa de audiências de mais de 50%, e milhares de Russos aguentam temperaturas abaixo de zero e esperam, em fila, durante mais de uma hora, só para espreitarem [essa ‘vida real’] através duma janela do apartamento. Milhões já visitaram esse site da Internet - que bloqueia frequentemente sob o peso do tráfego»13.
- Quanto à situação da Igreja Católica: em 1997, a Rússia decretou uma lei nova sobre “liberdade de consciência” que deu um estatuto privilegiado à Ortodoxia Russa, ao Islamismo, Judaísmo e Budismo, que foram consideradas “as religiões tradicionais” da Rússia; por seu turno, era necessário às paróquias católicas obterem a aprovação dos burocratas locais, só para terem o direito de existir. Como resultado:
- O minúsculo Sacerdócio católico na Rússia, uns 200 Sacerdotes, é formado quase inteiramente por Clerigos nascidos no estrangeiro, sendo, a muitos deles, concedidos vistos de entrada no país com um prazo apenas de três meses - enquanto os homens de negócios recebem vistos de entrada de seis meses14.
- Há apenas dez Sacerdotes nascidos na Rússia em todo o país - cinco na Sibéria e cinco no Cazaquistão -, tendo 95% dos Sacerdotes e Freiras nascido no estrangeiro. Na opinião franca do Senhor Arcebispo Bukovsky, a Igreja Católica «é pequena (…) e será sempre pequena»15.
- Os Católicos constituem menos de metade de 1% da população russa, enquanto os Muçulmanos russos ultrapassam 10 vezes mais o número de Católicos. Segundo notícia da Rádio Free Europe, o Catolicismo é visto, na Rússia, como «um tipo de esquisitice inexplicável - qual a razão por que um Russo haveria de ser católico?»16.
- Segundo o Vaticano, há 500.000 Católicos na Rússia, a maioria dos quais estão na Sibéria - para onde Stálin enviara os seus avós17.
Dado este tipo de evidências, não era possível - pura e simplesmente - que se desvanecesse facilmente a interrogação sobre se a Consagração da Rússia teria sido feita do modo pedido por Nossa Senhora de Fátima ou não. Portanto, na perspectiva dos executores da nova orientação da Igreja - a Adaptação da Igreja ao Mundo -, algo tinha que ser feito com respeito a Fátima. E, em especial, algo tinha que ser feito com respeito a um Sacerdote canadiano, de nome Padre Nicholas Gruner, cujo apostolado de Fátima se tinha tornado uma voz de peso para milhões de Católicos que estavam convictos de que a Consagração da Rússia ‘descarrilara’ devido aos planos de certas personagens do Vaticano. Era tão simples quanto isto: Fátima e “o Sacerdote de Fátima” tinham que ser enterrados de uma vez por todas.
O processo começou já há muito, em 1988, no momento em que - conta Frère François - «uma ordem veio do Vaticano dirigida às autoridades de Fátima, à Irmã Lúcia, a diversos eclesiásticos incluindo o Padre Messias Coelho e um sacerdote francês [evidentemente, o Padre Pierre Caillon] muito devoto de Nossa Senhora, ordenando a todos que deixassem de importunar o Santo Padre com o assunto da Consagração da Rússia». O Padre Caillon, devoto de Fátima, confirmou a emissão desta ordem: «uma ordem veio de Roma, que obrigava todos a dizerem e a pensarem: “A Consagração está feita. Tendo o Papa realizado tudo o que está ao Seu alcance, dignou-se o Céu aceitar este gesto”»18. Foi por esta altura (1988-1989) que muitos Apostolados de Fátima - que tinham persistido em que a Consagração da Rússia ainda não fora feita - inverteram inesperadamente as suas posições e declararam que a Consagração de 1984 tinha cumprido os desejos do Céu. Lamentavelmente, até mesmo o Padre Caillon logo a seguir mudou o seu testemunho e começou a dizer que a Consagração de 1984 tinha cumprido os pedidos da Santíssima Virgem.
Foi também por essa época que começaram a circular cartas, alegadamente da Irmã Lúcia, escritas à maquina e geradas por computador. Destas cartas - manifestamente incríveis - ficou típica a de 8 de Novembro de 1989, dirigida ao Senhor Noelker e que contém a afirmação da “Irmã Lúcia” de que o Papa Paulo VI consagrou o Mundo ao Imaculado Coração de Maria durante a sua breve visita a Fátima em 1967 - uma Consagração que nunca aconteceu, como a Irmã Lúcia decerto sabia, porque testemunhou pessoalmente a visita inteira19.
Deste modo emergiu a Linha do Partido na Mensagem de Fátima. A que chamamos, exactamente, “a Linha do Partido”? Vladimir Ilyich Lénin disse certa vez: «A mentira é sagrada e o engano será a nossa principal arma.» Portanto, não era surpresa nenhuma que o Pravda, na qualidade de órgão oficial do Partido Comunista Soviético, estivesse cheio de mentiras - embora a palavra russa Pravda signifique “verdade”. Então, um jornal chamado “Verdade” estava sempre cheio de mentiras: porque, como dizia Lénin, «A mentira é sagrada e o engano será a nossa principal arma.»
Ora um mentiroso não convencerá ninguém com as suas mentiras, se usar ao peito um grande cartaz a dizer “Mentiroso!”. Nem sequer um palerma acreditaria em tal homem. Para o mentiroso convencer as pessoas de que as suas mentiras são verdade, então a verdade tem que ser redefinida. É isto mesmo o que quer dizer a frase de Lénin «a mentira é sagrada (…)». A mentira torna-se “verdade” e é-lhe servilmente dada adesão, em vez da verdade. Como dizem as Sagradas Escrituras ao pronunciarem a maldição no livro de Isaías: «Ai daqueles que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que mudam as trevas em luz e a luz em trevas.» (Is. 5:20). Às trevas da falsidade é dada a aparência da luz da verdade - e é este um dos erros fundamentais da Rússia.
Mas este truque de transformar uma mentira em “verdade” não tem a sua origem na Rússia nem nos Comunistas; a sua origem é o demónio, que é o Pai das Mentiras. São Paulo fala do demónio sob a aparência de um anjo de luz. Para ser mais específico, ele está a referir-se ao Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo: «Mas ainda que alguém - nós mesmos ou um anjo do Céu - vos anuncie outro Evangelho além do que aquele que vos tenho anunciado, esse seja anátema.» (Gal. 1:8). É o demónio, aparecendo sob o aspecto de um anjo de luz, que dá a aparência da verdade, de modo a enganar por meio da mentira. E foi daqui que o erro - “a mentira é sagrada” e “a falsidade é a verdade” - se originou.
O Padre Paul Kramer relata uma conversa que teve com o General Daniel Graham, do Exército dos E.U.A. «O General Graham disse que uma vez esteve na Rússia com um oficial soviético e que esse oficial soviético lhe perguntou: “O Senhor não deseja a paz?” E o General respondeu: “Não! Porque eu conheço a vossa definição de paz. Não quero esse género de paz.” Enquanto conversavam, passaram por um cartaz gigante que mostrava soldados armados de espingardas. No cartaz havia a legenda: “Pobieda kommunista eta mir.” Que em português é: “A vitória comunista é a Paz.”»
Segundo o ensino marxista, o Estado comunista faz a guerra para fomentar a revolução e emprega todos os meios possíveis de engano - guerra total - de modo a subjugar o Mundo inteiro ao Comunismo. Uma vez que a guerra total se tenha efectuado e que o Comunismo seja vitorioso sobre todo o planeta, haverá então a versão comunista de “paz”. Mas, na realidade, o que é a Paz? A Paz é definida com mais precisão por Santo Agostinho: «A Paz é a tranquilidade da ordem». Qual é a definição correcta? Não se trata de um assunto de avaliação subjectiva. São Tomás de Aquino explica: «ens et verum convertunter», que é uma maneira erudita de dizer que a verdade é convertível com a realidade - ou seja, aquilo que é objectivamente real é, por essa mesma razão, objectivamente verdadeiro. Por outras palavras: a verdade é aquilo que é, enquanto uma mentira é aquilo que não é. Aquilo que não é não pode ser verdade. Logo, se alguém diz, por exemplo, que o branco é preto, tal afirmação é uma mentira - por mais alta que seja a autoridade daquele que faz a afirmação.
Segundo a doutrina marxista, todavia, a verdade é aquilo que promove a revolução comunista. E o que é que promove a revolução comunista? Tudo o que tiver sido decidido constituir a Linha do Partido: aquilo que o Partido dita para ser verdadeiro passa a ser “a verdade”, mesmo se, efectivamente, for uma mentira. Deste modo, se a Linha do Partido afirma “que o preto é branco”, é nisso, portanto, que todos os membros do Partido têm de acreditar - simplesmente porque assim foi decidido pelo Partido: “que o preto é branco”.
Ora, tal como houve uma espécie de “Estalinização” da Igreja, no sentido de uma Adaptação da Igreja ao Mundo, assim também há-de haver uma espécie de Linha do Partido estalinista sobre Fátima: uma versão da Mensagem de Fátima ditada pelas cúpulas e à qual todos os membros da Igreja da Adaptação pós-conciliar têm de aderir. Essencialmente, a Linha do Partido sobre Fátima resume-se a isto: A “Consagração da Rússia” foi levada a cabo por completo, pelo que todos devem deixar de pedir que ela se faça. Temos “a paz”, tal como foi vaticinado por Nossa Senhora de Fátima. A Rússia está a realizar a “conversão” que Nossa Senhora prometeu. Logo - segundo a Linha do Partido - nada na Mensagem de Fátima ficou por fazer: e Fátima pertence agora ao passado.
Como veremos, todos os termos entre vírgulas altas - “consagração da Rússia”, “paz” e “conversão” - foram redefinidos, para a Linha do Partido se acomodar a Fátima. Portanto, em tudo o que diga respeito a Fátima, é-nos agora pedido que acreditemos o equivalente a “o que é preto é branco” - porque é essa a Linha do Partido.
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Ave Cor Mariae!